Um Sonho Tranquilo,
de Zhan Lu, trata com imenso carinho seu quarteto de protagonistas. Esses jovens
(três rapazes e uma moça) loosers
trafegam por um bairro periférico de Seul, na Coreia do Sul, tendo seus sonhos,
frustrações e algumas marcas do passado registradas com delicadeza e lirismo
pelo diretor. Ela (interpretada por Ye-ri Han), imigrante chinesa, pena para
cuidar do pai paralisado por uma doença, enquanto administra um pequeno bar frequentado
pelos amigos; eles (Ik-joon Yang, Jung-bum Park e Jong-bin Yun), são
apaixonados pela garota e vivem seus próprios dramas (um é epiléptico, outro
sofre de transtorno bipolar e, norte-coreano, é considerado desertor em seu
país, enquanto o terceiro foi criado em um orfanato). Juntos, eles formam uma
adorável família, que, apesar de forjada em meio a provações, é movida por
fortes doses de inocência.
É interessante notar
como Zhan Lu insere no filme referências ao cinema, arte do sonho por excelência.
A começar pelo trio de atores, todos também cineastas, passando pelo hábito da
protagonista feminina de frequentar as sessões gratuitas do Arquivo de Cinema Coreano,
chegando à maneira como certas cenas e situações da narrativa são construídas remetendo
à encenação cinematográfica. Os próprios personagens falam disso mais de uma
vez ao longo de Um Sonho Tranquilo: há diálogos sobre o desejo de alguns deles
de se tornarem atores e há ao menos um momento em que determinado acontecimento
é percebido pelo quarteto como semelhante a uma cena de filme.
Mas é mesmo na dimensão
onírica que Um Sonho Tranquilo escancara essa relação metalinguística, na
capacidade, talvez única, do cinema de registrar sonhos e de se constituir
também como sonho. Sonhar é um ato fundamental, existencial, para os
protagonistas, dada a realidade agridoce da qual são parte. Zhan Lu constrói seu
filme como uma mistura discreta de sonho e vigília: há lacunas, ações que
parecem não se completar, personagens que desaparecem ou aparecem subitamente
e, sobretudo, a felicidade possível nascida de uma relação entre figuras
marginais, próprias do onírico; mas há também a dureza e as impossibilidades
que a vida desperta traz.
Chun-mong, 2016
Zhan Lu
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