História de Taipei (1985)
transborda modernidade. Dirigido pelo taiwanês Edward Yang, esse belíssimo filme se filia a um cinema de desdramatização dramatúrgica e
narrativa, para abordar o cotidiano de um relacionamento em crise. A matriz
primeira é, claro, Antonioni, em seu interesse existencial pela incomunicabilidade
nos tempos modernos, manifesto tanto na inação de seus personagens, geralmente
tomada por frieza ou apatia, quanto na tendência ao abstracionismo estético, revelada
no olhar frequente para as formas geométricas produzidas pelos espaços urbanos –
O Eclipse (1962) e Deserto Vermelho (1964) são exemplares nesse
sentido. Todos esses elementos estão presentes também em História de Taipei: os
protagonistas, Chin (Chin Tsai) e Lung (Hou Hsiao Hsien), namorados, seguem
suas respectivas rotinas e vivem a crise instalada nessa relação com uma
postura que parece transitar entre o tédio e a melancolia; ao mesmo tempo, são
recorrentes as imagens de arranha-céus e avenidas abarrotadas de carros na
capital de Taiwan, cenário transformado por Yang em personagem importante do
filme.
A sensação produzida por tais
imagens é de um fluxo contínuo, desconexo e fragmentado da existência,
simbolizado pelos muitos carros que seguem ininterruptamente nas mais variadas
direções, e de perda do sentido da vida em sociedade, algo explicitado pelo
comentário do colega de trabalho de Chin sobre os prédios cada vez mais parecidos na paisagem de
Taipei. Esse casal, prestes a deixar de sê-lo, bem como aqueles que os cercam (o já citado colega e amante de Chin, seus pais e sua irmã mais nova; a
ex-namorada de Lung e seu amigo de longa data), estão, portanto, atomizados,
incapazes de estabelecer conexões entre si. São filhos diretos de uma (pós?) modernidade na qual tudo que é sólido se desmancha no ar.
História de Taipei acaba sendo uma ponte entre o cinema de
Antonioni e Encontros e Desencontros
(2003), de Sofia Coppola, que também compartilha de todos esses interesses
temáticos enquanto, visualmente, até pela maior proximidade temporal e pelas
semelhanças entre Taipei e Tóquio, remete mais diretamente ao filme de Yang que
aos clássicos italianos da incomunicabilidade. Ainda que Coppola se abra mais
ao humor e à possibilidade do amor, ambos os filmes, História de Taipei e Encontros e Desencontros, têm
protagonistas desconectados com o mundo, isolados numa grande e luminosa
metrópole. O que Yang faz de diferente é introduzir um forte elemento temporal,
associado ao personagem Lung, que, já na casa dos trinta, sofre com a nostalgia
da juventude que se esvai, da época em que fazia sucesso como jogador de
beisebol e parecia ter uma vida promissora pela frente. A potência do
tratamento dado pelo diretor a esse tema, por vezes lembrando o maravilhoso Sonhos do Passado (1973), de John G.
Avildsen, torna seu filme uma obra-prima incontornável.
Edward Yang
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