sexta-feira, 30 de julho de 2010

Alice no País das Maravilhas, Tim Burton e o cinema do quase



Tim Burton é o cineasta do quase. Em sua vasta filmografia há sim grandes filmes (Edward Mãos-de-Tesoura, A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça, A Fantástica Fábrica de Chocolate, Sweeney Todd), mas somente uma obra-prima: o pouco visto Ed Wood. Todos esses outros trabalhos que citei, e tantos mais, são filmes memoráveis em alguns aspectos, especialmente em sua composição visual, mas que, por um motivo ou por outro, estão sempre a um passo de se tornarem obras-primas, mas não chegam lá. Ficam no quase.

O esmero excessivo de Burton com o visual de seus filmes é, sem dúvidas, admirável. É, provavelmente, um dos grandes responsáveis pelo culto que existe ao diretor entre determinados grupos (algo um tanto irritante, na verdade, principalmente quando citam Burton como se o cineasta fosse um gênio e como se o fato de adorá-lo representasse uma marca de inteligência, de conhecimento cinematográfico e de visão "alternativa" do mundo do cinema). No entanto, talvez seja também um dos principais responsáveis pela falha constante de seus trabalhos. Há muita forma e pouco conteúdo no cinema de Burton. E não há exemplo melhor disso do que seu mais recente filme, Alice no País das Maravilhas.

Visualmente esplendoroso, como seria de se esperar, a nova adaptação do clássico de Lewis Caroll é insossa do início ao fim. É a radicalização do cinema de Burton: cenários (digitais) grandiosos, cores, efeitos especiais e maquiagem em excesso vêm acompanhados de pouquíssima profundidade dramática, personagens rasos como um pires, metáforas e mensagens óbvias... ao lado de seu companheiro frequente de exagero, Johnny Depp, Burton perde de vez a mão, e entrega aquele que talvez seja seu pior filme. Porque, diferentemente de todos os outros exemplares de sua filmografia, Alice no País das Maravilhas consegue ainda ser um porre. E olha que não tem nem 2 horas de metragem! Talvez este represente, ao menos, uma boa oportunidade para o cineasta repensar o tipo de cinema que vem produzindo ao longo de mais de 20 anos. Afinal, foi quando fez um filme pequeno, em preto-e-branco, sem elementos fantásticos, sobre a vida daquele que é considerado o pior cineasta de todos os tempos, que Tim Burton alcançou seu ápice.


Alice no País das Maravilhas 
Alice in Wonderland, 2010
Tim Burton

segunda-feira, 19 de julho de 2010

[à prova de morte]

À Prova de Morte
Death Proof, 2007
Quentin Tarantino



26 de novembro de 2007. Essa foi a data em que assisti, no cinema, Planeta Terror, de Robert Rodriguez. Definitivamente, é vergonhoso que, somente após quase 3 anos, seu filme-irmão, À Prova de Morte, de Quentin Tarantino, entre em cartaz no Brasil. Nesse intervalo, campanhas foram criadas por cinéfilos, e muitas pessoas começaram a defender que simplesmente lançassem-no direto em DVD, desde que tivessem a oportunidade de assistir a, até pouco tempo, nova obra de Tarantino. Pois bem, como todos sabem, Bastardos Inglórios chegou aos cinemas brasileiros, e nada de À Prova de Morte. É difícil entender tanta demora, principalmente por se tratar de um filme que, se não é um blockbuster, tem, indubitavelmente, um bom potencial de bilheteria - basta ver o êxito comercial de Bastardos. E o mais lamentável é que, além de ser o trabalho de um diretor reconhecidamente talentoso e sempre original, este é verdadeiramente um ótimo filme - ainda que seja, provavelmente, o "menos bom" do cineasta nessa década, que teve, além de Bastardos Inglórios, os dois volumes de Kill Bill.
Em primeiro lugar, À Prova de Morte é consideravelmente superior ao longa de Rodriguez. Enquanto aquele exagerava na tosqueira para contar sua história de zumbis, Tarantino aposta na sua capacidade de criar diálogos memoráveis, e seu filme é quase totalmente estruturado a partir das conversas entre seus personagens - e a fluência acelerada desses diálogos, o brilhantismo absoluto de alguns deles, parece exigir bastante de um elenco impecável, com destaque para Rose McGowan (que também roubara a cena em Planeta Terror) e para um inspirado Kurt Russell, que cria um vilão impagável, repulsivo e adorável ao mesmo tempo, e difícil de esquecer (é uma interpretação digna de prêmios, mas como geralmente filmes como esse não costumam ser considerados para tais, o show de Russell acabou passando batido para muitos). Quando parte para cenas de ação, no entanto, a qualidade não cai. São duas maravilhosas perseguições de carro, eletrizantes, violentas e irresistivelmente divertidas. A brutalidade da primeira, filmada com um misto de realismo e exagero que só Tarantino consegue dosar corretamente, é complementada pela tensão da segunda, que leva ao final deliciosamente catártico de À Prova de Morte. Diz-se que downloads não autorizados de filmes é crime. Sinceramente? Crime é levar tanto tempo para permitir que uma obra como essa seja assistida, seja qual for o motivo misterioso dessa falta de respeito.


* Texto originalmente publicado, com algumas modificações, em 09 de Janeiro de 2010.

domingo, 4 de julho de 2010

[top 50: os melhores filmes da década 2000]

Montar listas, para mim, é sempre um parto. Nunca me sinto suficientemente capaz de escolher "os melhores" ou "os piores" em alguma coisa. Mas, ao mesmo tempo, sou viciado nisso. E, desde meados do ano passado, me propus a escolher os melhores filmes da década que terminou há poucos meses, postando aqui no blog, vez ou outra, um novo ranking dos anos 2000, até culminar, finalmente, com a lista final dos "melhores filmes da década". Pois bem, depois de muita enrolação e de 5 rankings ("indicados ao Oscar de filme estrangeiro", "filmes brasileiros", "filmes baseados em HQ's", "histórias de amor" e "indicados ao Oscar de melhor filme"), finalmente cheguei aonde queria chegar desde o início. Não, não acho que minha lista final deva ser levada a sério. Sequer consegui assistir a todos os filmes que queria ter assistido, que considerava minimamente fundamentais para compor um ranking como esse (não há, por exemplo, nenhum filme do tailandês Apichatpong Weerasethakul, simplesmente porque não vi nenhum trabalho dele, por culpa exclusivamente minha). Esse ranking é, no fim das contas, a compilação de 50 filmes produzidos nos últimos 10 anos que eu simplesmente amo. Pronto, é isso.



50- O Pianista
The Pianist, 2002
Roman Polanski

49- Cartas de Iwo Jima
Letters from Iwo Jima, 2006
Clint Eastwood

48- A Vila
The Village, 2004
M. Night Shyamalan

47- Antes do Pôr-do-Sol
Before Sunset, 2004
Richard Linklater

46- O Escafandro e a Borboleta
Le Scaphandre et le Papillon, 2007
Julian Schnabel

45- Bom Dia, Noite
Buongiorno, Notte, 2003
Marco Bellocchio

44- Miami Vice
Miami Vice, 2006
Michael Mann

43- Os Sonhadores
The Dreamers, 2003
Bernardo Bertolucci

42- As Invasões Bárbaras
Les Invasions Barbares, 2003
Denys Arcand

41- Guerra ao Terror
The Hurt Locker, 2009
Kathryn Bigelow


40- 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias
4 Luni, 3 Saptamani si 2 Zile, 2007
Christian Mungiu

39- Old Boy
Old Boy, 2004
Park Chan-Wook

38- Entre os Muros da Escola
Entre les Murs, 2008
Laurent Cantet

37- O Lutador
The Wrestler, 2008
Darren Aronofsky

36- Maria Antonieta
Marie Antoinette, 2006
Sofia Coppola

35- Entreatos
Entreatos, 2004
João Moreira Salles

34- O Aviador
The Aviator, 2004
Martin Scorsese

33- Zodíaco
Zodiac, 2007
David Fincher

32- Kill Bill - Vol. 1
Kill Bill - Vol. 1, 2003
Quentin Tarantino

31- Cidade de Deus
Cidade de Deus, 2002
Fernando Meirelles


30- O Senhor dos Anéis: A Sociedade do Anel
The Lord of the Rings: The Fellowship of the Ring, 2001
Peter Jackson

29- A Vida dos Outros
Das Lebens der Anderen, 2006
Florian Henckel von Donnersmarck

28- Encontros e Desencontros
Lost in Translation, 2003
Sofia Coppola

27- Três Enterros
The Three Burials of Melquiades Estrada, 2005
Tommy Lee Jones

26- Exílios
Exils, 2004
Tony Gatlif

25- Desejo e Reparação
Atonement, 2007
Joe Wright

24- Munique
Munich, 2005
Steven Spielberg

23- Amantes
Two Lovers, 2009
James Gray

22- Os Infiltrados
The Departed, 2006
Martin Scorsese

21- Sobre Meninos e Lobos
Mystic River, 2003
Clint Eastwood


20- Menina de Ouro
Million Dollar Baby, 2004

Clint Eastwood


19- A Professora de Piano

Le Pianiste, 2001

Michael Haneke


18- Dançando no Escuro

Dancer in the Dark, 2000

Lars von Trier


17- Dogville

Dogville, 2003

Lars von Trier

16- A Fita Branca

Das Weisse Band, 2009

Michael Haneke


15- 2046 - Os Segredos do Amor

2046, 2004

Wong Kar-Wai


14- Bastardos Inglórios

Inglourious Basterds, 2009

Quentin Tarantino


13- Sangue Negro

There Will Be Blood, 2007

Paul Thomas Anderson


12- Memórias de um Assassino

Salinui Chueok, 2003

Bong Joon-Ho


11- Amor à Flor da Pele

In the Mood for Love, 2000

Wong Kar-Wai


10- Caché
Caché, 2005
Michael Haneke


9- Gangues de Nova York
Gangs of New York, 2002
Martin Scorsese


8- Cidade dos Sonhos
Mulholland Drive, 2001
David Lynch


7- Elefante
Elephant, 2003
Gus van Sant


6- Lavoura Arcaica
Lavoura Arcaica, 2001
Luiz Fernando Carvalho


5- Fale com Ela
Hable con Ella, 2002
Pedro Almodóvar


4- O Segredo de Brokeback Mountain
Brokeback Mountain, 2005
Ang Lee


3- Marcas da Violência
A History of Violence, 2005
David Cronenberg


2- Reis e Rainha
Rois et Reine, 2007
Arnaud Desplechin


1- Onde os Fracos Não Têm Vez
No Country for Old Men, 2007
Joel Coen & Ethan Coen