Com adorável despretensão e clima tirado diretamente das
matinês de outrora, Piratas do Caribe: A
Maldição do Pérola Negra foi um intruso um pouco inesperado entre os filmes
de maior bilheteria de 2003. Isso porque, naquele ano, não parecia haver muito
espaço para outros blockbusters
diante das estreias da segunda e terceira partes de Matrix e do capítulo final de O
Senhor dos Anéis (além de X-Men 2
e Exterminador do Futuro 3, para
nos restringirmos às continuações). Ainda assim, Piratas do Caribe arrecadou mais de 600 milhões de dólares mundo
afora, ficando à frente, inclusive, de Matrix
Revolutions, e ainda conseguiu uma inusitada indicação ao Oscar para Johnny
Depp, ator até então respeitado por sua constante busca por papeis originais e
que finalmente parecia se transformar num astro.
Logo em seguida, no entanto, Piratas do Caribe ganhou duas sequências que até tinham alguma
qualidade (sobretudo O Baú da Morte),
mas que representaram um abandono completo da despretensão do primeiro filme,
em prol do inchaço da trama, que aumentara consideravelmente em escala e
ganhara um bocado de novos personagens. Além disso, Depp passou a repetir os
trejeitos do pirata Jack Sparrow, transformado em fenômeno pop, em praticamente todos os filmes que fez a partir dali, pouco a
pouco abandonando a antiga busca por originalidade que o tornara celebrado por
tantos e se tornando sinônimo daquela esquisitice calculada que tão bem cabe
nos últimos filmecos de Tim Burton.
Sob certos aspectos, Vingadores:
Era de Ultron parece começar a traçar caminho semelhante para o grupo de
heróis da Marvel no cinema. Ainda que o primeiro filme, de 2012, não fosse
pequeno em escala – e tampouco uma aposta arriscada nas bilheterias, já que se
tratava da culminância de diversos filmes-solo bem-sucedidos –, havia nele um
clima de aventura despretensiosa, uma espécie de chute no balde da seriedade
que se passou a exigir de adaptações cinematográficas de quadrinhos, sobretudo
depois da passagem de Christopher Nolan por Gotham City. Isso se
perde na continuação, que, assim como Piratas
do Caribe 2 e 3, aposta numa
trama inchada, recheada de personagens novos e com um tom um tanto mais sério
que o do primeiro Vingadores. E há,
claro, Tony Stark, uma espécie de Jack Sparrow Reloaded, personagem cuja graça
se perdeu há muito tempo e cujos trejeitos Robert Downey Jr. insiste em
carregar para todos os papeis que interpreta. Como Depp, Downey Jr., também um
ator outrora reconhecido por seu talento, se acomodou no papel que lhe rendeu o
estrelato – além de alguns milhões de dólares.
É uma pena que Vingadores:
Era de Ultron siga por esse caminho. Não só porque seu antecessor era muito
bom, mas também pela existência de alguns sopros de vida inteligente no meio de
sua trama rocambolesca. Quando o diretor e roteirista Joss Whedon se (e nos)
permite respirar, coisas boas aparecem: a piada envolvendo o martelo de Thor, que
toma considerável tempo de tela (sobretudo para uma piada, em um filme que é
cheio delas) e é retomada em momento posterior da narrativa, em demonstração
rara de timing cômico de Whedon; o espaço
dado ao personagem de Jeremy Renner, que injeta alguma humanidade numa história
que tenta o tempo todo impressionar pela grandiosidade. Mas são pequenas
calmarias diante da tempestade que é Era
de Ultron. E o que mais assusta é que a coisa vai aumentar. O nome do
próximo filme, que na verdade será dividido em duas partes, já dá a pista: Guerra Infinita. Com
bilhões de arrecadação no horizonte, como convencer os responsáveis pelos
Vingadores de que, muitas vezes, menos é mais? Nem a proximidade do exemplo de
Piratas do Caribe – e de outras franquias que se enrolaram em suas próprias
pretensões, como Matrix e O Hobbit – parece ser suficiente, infelizmente.
Avengers: Age of Ultron, 2015
Joss Whedon
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