As expectativas de prêmios que se costuma depositar em cada novo filme de Sam Mendes, desde que o diretor venceu o Oscar em sua estreia no cinema, com Beleza Americana, parece ter atrapalhado o êxito de seu cinema (ainda que seus três últimos filmes sejam bastante subestimados, principalmente o último, e espetacular, Foi Apenas um Sonho). Nesse sentido, esse Distante Nós Vamos, guinada de Mendes para um típico cinema indie norte-americano, poderia ser uma espécie de frescor em sua carreira, um filme com clima mais light, sem nenhuma pressão por seriedade e prêmios. Como gosto de todos os filmes que Mendes fez até aqui, não deixo de desconfiar dessa sua passagem a um cinema geralmente alicerçado em uma série de lugares-comuns, que, ao menos na maior parte do tempo, trás muito pouco de novo. No entanto, é admirável como o diretor, mesmo mudando de estilo radicalmente, mesmo trabalhando, inevitavelmente, com os clichês indies, continua fazendo um cinema maduro, adulto. Distante Nós Vamos talvez seja, na qualificada carreira de Mendes, seu filme "menos bom". Mas é absurdamente adorável, tem uma dupla de protagonistas encantadores (John Krasinski e Maya Rudolph são carismáticos ao extremo), e é de uma sinceridade emocionante. Sinceridade, aliás, talvez seja a principal contribuição de Sam Mendes a esse "gênero", algo que tem faltado em boa parte de seus exemplares.
Chuva
Lluvia, 2008
Paula Hernández
Esse argentino Chuva é o tipo do filme pelo qual não se dá nada, mas que acaba conquistando quem o assiste por sua simplicidade, honestidade e delicadeza. Não tem absolutamente nada demais no trabalho de Paula Hernández, e a ideia de colocar dois estranhos descobrindo-se mutuamente em meio a uma situação-limite (no caso, um temporal que dura alguns dias em Buenos Aires) não é lá grande novidade. A calma com que a diretora desenvolve sua dupla de protagonistas, entretanto, revelando bem aos poucos cada pequeno detalhe de suas histórias de vida (acabamos descobrindo suas personalidades junto com eles próprios), faz com que Chuva torne-se não só uma experiência agradável e envolvente, mas quase íntima - pelo compartilhamento de sentimentos com aquele casal (que, aliás, tem em Valeria Betuccelli e Ernesto Alterio uma dupla de intérpretes de alta qualidade, sendo o trabalho de Alterio o mais delicado e comovente dos dois, especialmente em sua relação com a figura de seu pai). Só me parece uma pena, já que citei o personagem do pai do protagonista, que este, que talvez seja o mais melancólico e interessante personagem do filme, seja justamente aquele que não aparece - por mais que seja compreensível essa escolha de Hernández por restringir seu foco ao casal Alma / Roberto. Enfim, talvez seja essa ausência que torne sua "presença" tão forte, e eu esteja considerando como um problema o que na verdade é uma êxito da diretora. E talvez esse tipo de dúvida já seja o suficiente para fazer a experiência de assistir a Chuva algo válido.
Séraphine
Séraphine, 2009
Martin Provost
Séraphine Louis (ou Séraphine de Senlis) é uma figura fascinante em seu misto de loucura, devoção religiosa exacerbada e genialidade para a pintura. Yolande Moreau, a atriz que lhe dá vida nessa cinebiografia, capta essas nuanças da personagem com perfeição, entregando uma interpretação forte, impactante. Séraphine, o filme, no entanto, é o oposto disso. É uma biografia de época absurdamente tradicional, um filme quadrado mesmo, que filma a vida da pintora, da pobreza à loucura, passando pelo sucesso, de forma absolutamente linear e preguiçosa. Não há o menor esforço do diretor Martin Provost em transformar seu trabalho em algo ousado, que fuja do óbvio: se é preciso explicitar a chegada da guerra, mostra-se alguns soldados correndo pelas ruas; se o contexto histórico agora é o da crise de 1929, ouve-se uma notícia didática sobre a crise no rádio, e assim por diante. Provost até tem o mérito de criar algumas belas imagens (a cena final, por exemplo), mas é só. Quem consegue salvar-se nesse amontoado de mediocridade é mesmo Moreau, hipnotizante em cena - já seu co-protagonista, Ulrich Tukur, ganha um personagem extremamente burocrático, tendo pouquíssimas chances de sair do convencional (talvez seu único momento de destaque no filme seja sua reação emocionada, e emocionante, ao visitar a protagonista no manicômio, já próximo ao final de Séraphine). Não deixa de ser lamentável que Séraphine tenha vencido tantos prêmios no último César. Difícil entender o porquê.
Um comentário:
Por algum motivo, acho que vou amar "Distante Nós Vamos"...
Wally [Cine Vita]
http://cinevita.com.br/
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