O Curioso Caso de Benjamin Button
The Curious Case of Benjamin Button, 2008
David Fincher
Se o esplêndido Zodíaco já promovera uma certa ruptura no cinema de David Fincher, adotando uma estrutura mais clássica, uma estética mais tradicional e uma câmera mais discreta, O Curioso Caso de Benjamin Button leva essa mudança ainda mais longe: é um grandioso épico dramático, com tom intimista, é verdade, mas que possui um formato bastante tradicional, apesar de contar uma história inusitada. Isso traz conseqüências boas e ruins. Por um lado, Benjamin Button é indiscutivelmente um belo filme, dramaticamente envolvente, com um elenco impecável (Brad Pitt, como era de se esperar, está excelente, e bastante convincente, no papel do sujeito que nasce velho e rejuvenesce com o passar do tempo, cativante desde seus primeiros momentos em cena) e que funciona naqueles que talvez sejam seus dois principais objetivos: cria um protagonista altamente empático, e, o que é importante, verossímil e extremamente humano (mesmo em sua excepcionalidade), e consegue tornar verdadeira e emocionante a história de amor desse protagonista com a personagem vivida por Cate Blanchett (também muito bem em cena, ainda que sua Daisy não seja uma figura tão memorável quanto outras vividas pela atriz), ainda que demore um pouco para isso, o que acaba sendo fundamental para que a trama funcione.
Por outro lado, há problemas. Primeiramente, o texto de Eric Roth foge bastante do conto de F. Scott Fitzgerald que o inspirou, aproximando-se em demasia de outro roteiro seu, Forrest Gump. Isso não teria de ser necessariamente ruim, no entanto, o filme acaba ganhando uma magnitude excessiva, que o conto não possuía. A simplicidade direta e objetiva do texto de Fitzgerald se perde, sendo transformada, como já dito, em uma história épica. A adaptação possui inúmeros acertos, é verdade, como a maior parte dos personagens que Roth cria, e que não estavam no original, mas falta essa simplicidade de Fitzgerald que, nas mãos de Fincher, deveria gerar uma obra-prima. Além disso, a opção por contar a história em flashbacks, a partir da personagem de Blanchett e sua filha, soa excessivamente clichê e esquemática, só funcionando realmente em alguns poucos momentos, especialmente conforme Benjamin Button se aproxima de seu epílogo, ao mesmo tempo que, em determinado trecho do filme, a narrativa se torna truncada (mais ou menos entre o retorno de Benjamin da guerra e o acidente de Daisy), mesmo enfadonha.
Se recuperando quando finalmente volta seu foco para os momentos em que Benjamin e Daisy vivem juntos (finalmente tornando o amor do casal palpável), O Curioso Caso de Benjamin Button caminha até seu final elegantemente, lembrando-nos de que estamos diante de um filme de David Fincher e de uma história de amor belíssima, contada com enorme sensibilidade. Quando chega ao fim, a reflexão proposta pelo trio Fitzgerald-Roth-Fincher acerca da inevitabilidade da morte e a forma como lidamos com ela se impõe sobre os deslizes cometidos no caminho, e o filme toca fundo no espectador (exatamente como fazia, há quase 15 anos, o já citado Forrest Gump). A beleza dos últimos momentos de O Curioso Caso de Benjamin Button consegue mesmo nos fazer esquecer que David Fincher é capaz de muito mais, e nos lembrar que, mesmo assim, estamos diante de um filme que, mesmo que demore um pouco para isso, se revela verdadeiramente grande, e não somente grandioso. Ainda que não tanto quanto poderia ser.
8 comentários:
Achei o filme um pouco (só) acima da média, perdendo o ritmo em muitos momentos, se arrastando em cenas que poderiam ser breves. E não entendi ainda as comparações com "Forrest Gump".
Abração
Nossa, acho que as comparações são bem óbvias: protagonista com algo de especial, que atravessa o mundo, é apaixonado por uma amiga de infância e que traz, no fim das contas, uma forma inocente e bela de enxergar o mundo.
E ainda tem o amigo que morre na guerra ...
Eu decidi esquecer Forrest Gump ao escrever minha resenha, embora as semelhanças são muito óbvias. Mas eu adorei o filme, e eu pensei que me incomodaria pela estrutura do filme - as cenas no hospital e a história contada por flashbacks - mas eu adorei o filme.
Espero que na hora da revisão isso não me incomode! =S
Publiquei lá algumas palavras sobre o filme em meu blogue! Até mais e parabéns mais uma vez pelo texto!
Wallace,
se pegarmos essas características como comparação, há que se admitir que o cinema vem produzindo muitos Forrests ao longo desses anos.
Sendo bem sincero, não me lembrei de Gump em nenhum momento de "Benjamin Button".
Abração
Hmmm ... não sei, Demas, não consigo me lembrar de outros filmes que possuam tais características tão claramente ... talvez Peixe Grande ... ao menos não com todas elas juntas numa mesma trama. Jovem com alguma característica especial, que vive uma longa jornada, viaja por diversas partes do mundo, perde um amigo querido na guerra, tem uma mãe (mesmo que aqui, adotiva) que o protege e o ama acima de tudo, é apaixonado por uma amiga de infância e que possui uma forma bela e inocente de enxergar a vida. Eu, sinceramente, só consigo pensar em dois filmes: Forrest Gump e Benjamin Button.
No entanto, que fique claro, não acho que isso seja necessariamente um demérito do filme. Gosto de Gump e gosto de Button. É que, como disse, o conto que o inspirou possuía uma simplicidade, que o aproximava muito mais da fábula, e que, se fosse utilizado no filme, creio que o resultado seria melhor ainda do que foi. Não que eu ache que devesse ser fiel ao conto no que diz respeito aos acontecimentos e personagem, mas sim na forma como a história é narrada.
Tenho muita, mas muita vontade mesmo de conferir esse filme... pelo que ouvi dizer, tem muita chance de me agradar. O fato de possuir semelhanças com "Forrest Gump", por exemplo, atrai muito minha curiosidade, tendo em vista que "Forrest Gump" é o meu filme preferido nesse gênero. Tentarei conferi-lo nessa sexta, se não surgir nenhum imprevisto. Abraço!
Demorei, mas finalmente assisti! Gostei bastante, principalmente da forma como o Fincher conduziu o filme, das atuações dos protagonistas, e do poder de causar reflexão sobre diferentes temas. Escrevi sobre ele lá no blog também. Abraço!
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