Mesmo sem ler uma linha da saga literária
A
Torre Negra, de Stephen King, é possível, diante de sua primeira
adaptação cinematográfica, reconhecer o potencial que carrega. Há claramente,
por exemplo, um universo e uma mitologia bem delineados por King, alicerçados
numa interessante mistura de referências à fantasia, à ficção-científica e ao western. No entanto, o filme dirigido
por Nikolaj Arcel (do ótimo O Amante da
Rainha) segue o caminho da construção de uma narrativa apressada, na qual
são oferecidas poucas chances de conhecer realmente os personagens e o mundo
pelo qual eles transitam. O Pistoleiro (Idris Elba), seu antagonista Homem de
Preto (Matthew McCounaghey), o garoto Jake (Tom Taylor) e sua família surgem
como clichês ambulantes (o herói silencioso e arredio, mas de bom coração; o
adolescente deslocado que carrega um grande poder ainda não descoberto; a mãe
dedicada e sofrida; o padrasto babaca e egoísta), disparando uma sucessão de
diálogos expositivos e/ou ruins (sobretudo os dois primeiros sujeitos, que têm
a função de apresentar ao espectador as regras da tal Mid-Land). Ao menos
McCounaghey convence no papel de um vilão sem nenhuma nuance, absolutamente
cruel, ainda que a ele também sejam dadas poucas chances para realmente se
destacar em cena.
É essa pressa o maior pecado de A
Torre Negra. Tudo no filme parece mal explicado, lançado de qualquer
maneira na narrativa: a tribo que de repente existe em meio a um lugar que aparentava
ser totalmente desolado, as diferentes criaturas que trabalham para o Homem de
Preto, os tais monstros que esse último pretende libertar etc. Mesmo uma breve
referência à vinculação entre as armas do pistoleiro e a espada Excalibur soa
como algo meticulosamente pensado pelo autor dos livros que acaba perdido numa
história mal contada. Pelo que consta, King mirou em O Senhor dos Anéis quando se dedicou a criar A Torre Negra. O filme de
Arcel, por sua vez, ao optar por ser uma aventura rasteira, esquecível,
inofensiva e nada preocupada com qualquer desenvolvimento mais complexo de sua
mitologia, lembra mais Percy Jackson e o
Ladrão de Raios (2010), aventura de fantasia infanto-juvenil baseada em
outro best-seller literário.
É uma pena que mais um diretor estrangeiro
aparentemente talentoso, ao migrar para Hollywood após ter um filme seu
indicado ao Oscar, desapareça num projeto grandioso como esse, no qual não lhe
é dado espaço para imprimir olhar próprio. Ele se junta assim, por exemplo, aos
alemães Florian Henckel von Donnersmarck
(de A Vida dos Outros, que nos
Estados Unidos fez O Turista), Oliver
Hirschbiegel (de A Queda, contratado
para dirigir Invasores, enésima e
insossa versão de Invasion of the Body
Snatchers) e ao brasileiro Walter Salles (que após Central do Brasil e Diários
de Motocicleta estreou em Hollywood com o bom, mas bastante impessoal, Água Negra, remake do horror japonês homônimo).
The Dark Tower, 2017
Nikolaj Arcel
2 comentários:
Com tantas adaptações de Stephen King ... uma ou outra iria dar errado, muita expectativa ao redor desse deu nisso.
cinefilosemconflito.wordpress.com
Eu gostei dessa adaptação! As premissas são interessantes, e a concepção tanto do pistoleiro como do Homem de Preto também tem seus acertos. A Torre Negra segue a linha dessas obras de fantasia que misturam gêneros para agradar todo mundo. O filme tem terror, mas também tem a aventura de um garoto pulando sobre telhados. Tem drama com a morte de personagens importantes, mas tem momentos cômicos de gente de outro mundo encarando uma Nova York lotada. A comparação mais óbvia seria com “O senhor dos anéis”, mas “A torre negra” é previsível demais para fazer cócegas no pé cabeludo de um hobbit. Adorei a trilha sonora, uma parte fundamental do filme.
Postar um comentário