No segundo dia de Festival do Rio, dediquei-me a dois filmes vindos do Leste Europeu e comandados por diretores consagrados internacionalmente: Um Episódio na Vida de um Catador de Ferro-Velho, do bósnio Danis Tanovic (vencedor do Oscar de filme estrangeiro com o excelente Terra de Ninguém), e Walesa, do veterano cineasta polonês Andrzej Wajda (de clássicos como Cinzas e Diamantes, O Homem de Mármore, O Homem de Ferro e Danton).
O primeiro é uma experiência árdua, na qual Tanovic narra a luta de uma família de ciganos por atendimento adequado no sistema de saúde público da Bósnia. O diretor aposta numa estética seca, brutal e naturalista para abordar temas relevantes socialmente, se aproximando bastante de exemplares do cinema romeno recente. É claro que a proposta ultra-naturalista de Tanovic não deixa de passar por certas estratégias dramáticas que têm o objetivo de manter o espectador tenso e envolvido com a história narrada (como na sequência em que a protagonista utiliza um cartão de seguro-saúde de outra pessoa para conseguir o atendimento desejado, correndo o risco de sofrer consequências que provavelmente agravariam ainda mais a já calamitosa situação daquela família), mas o filme consegue se equilibrar bem entre o denuncismo e a simplicidade cotidiana do universo que apresenta. Apesar de toda a dureza e miséria que se vê na tela, é dos pequenos momentos de carinho familiar e solidariedade entre vizinhos que emana a maior força Um Episódio na Vida de um Catador de Ferro-Velho. Belo filme.
Walesa, por sua vez, é uma cinebiografia bem tradicional de Lech Walesa (vivido pelo ótimo Robert Wieckiewicz), líder operário da oposição ao regime comunista polonês que, no início da década de 1990, chegou à presidência do país. Por motivos óbvios, é difícil não comparar o filme de Wajda com Lula, o Filho do Brasil, e, nesse sentido, apesar de seu formato igualmente quadrado, Walesa é um trabalho bem melhor acabado. Isso se dá provavelmente devido ao recorte preciso proposto pelo diretor: enquanto o longa de Fábio Barreto acompanhava Luis Inácio Lula da Silva do nascimento até as greves do ABC nos anos 80, focando também na trajetória de sua mãe, interessa a Wajda o momento em que Lech Walesa ascende ao protagonismo político num cenário de contestação crescente do comunismo. Por isso, apesar de retornar brevemente a 1970 e, no final, se estender até os anos 90, a narrativa de Walesa permanece durante quase todo o tempo concentrada entre os anos de 1980 e 1983, quando o protagonista fundou o movimento Solidariedade e liderou as grandes greves que pararam a Polônia, abalaram o regime vigente e transformaram-no em celebridade mundial, levando-o inclusive a ser laureado com o Prêmio Nobel da Paz. Reconhecido esse mérito, é preciso dizer que o filme se alonga um pouco demais e que seu formato pouco ousado não ajuda muito no esforço de torná-lo menos esquecível que tantas outras cinebiografias de líderes políticos produzidas mundo afora.
Epizoda u zivotu beraca zeljeza, 2013
Danis Tanovic
Walesa. Czlowiek z nadziei, 2013
Andrzej Wajda
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