sábado, 15 de agosto de 2015

Quarteto Fantástico




Há um grande filme escondido nesse novo Quarteto Fantástico. Na verdade, nem tão escondido assim, já que sua ótima primeira metade denuncia os acertos do diretor Josh Trank no olhar que lançou para o universo dessa família de super-heróis. Está ali uma bem-vinda seriedade, que destoa imensamente do humor tolo dos filmes de Tim Story sem perder de vista a empolgação e o frescor próprios da juventude de seus protagonistas. Está ali um certo cuidado no desenvolvimento dos personagens, que consegue extrapolar estereótipos – Victor von Doom, por exemplo, é apresentado como um jovem problemático e de temperamento difícil, mas, ainda assim, apenas um jovem, que também experimenta situações divertidas com seus colegas de pesquisa e futuros antagonistas – e construir relações verossímeis. Trank investe bastante tempo nisso, adiando ao máximo a introdução do elemento fantástico em seu filme, e o resultado é positivo: o espectador se aproxima dos personagens, compreende minimamente suas motivações, se interessa por seus destinos, ainda que nenhum dos atores esteja além do correto (o que não deixa de ser um desperdício, considerando o talento de gente como Miles Teller, Michael B. Jordan e Jamie Bell).

Daí vem a também muito boa sequência da viagem interdimensional e do acidente, seguida da descoberta, pelos personagens, dos poderes que agora possuem. Trank também faz isso bem (afinal, ele tem um filme só sobre adolescentes lidando com poderes recém-adquiridos), exprimindo com competência a dor física experimentada por Reed Richards, Johnny Storm e Ben Grimm. Mas, infelizmente, o que vem na sequência carrega Quarteto Fantástico ladeira abaixo. Se sobrou tempo de tela para a dinâmica inicial entre os personagens, faltou muito para o uso militar de Ben e Johnny e para a fuga pelo mundo de Reed – passagens com potencial para gerar conflitos interessantes, mas que no filme de Trank aparecem como clipes rápidos e desimportantes. O mesmo vale para o retorno de Doom e seu confronto com os heróis: tudo é apressado demais, as motivações do vilão não ganham o devido destaque e ele é descartado sem maior cerimônia. O diretor afirmou que houve forte interferência do estúdio e que seu filme era outro – algo não muito difícil de acreditar, considerando o histórico da Fox (Demolidor, os dois Quarteto Fantástico anteriores). Ficará restrito à imaginação um Quarteto Fantástico com duas horas e meia de duração, com Richards vivendo experiências inusitadas enquanto aprende a controlar seus poderes em diferentes partes do planeta e com Grimm e Storm vivendo os conflitos de colocar seus dons à serviço do big stick americano. Uma ficção científica séria, mas protagonizada por adolescentes, como imaginou Trank, e talvez dirigida por alguém com mais poder sobre seus filmes e igualmente identificado com o gênero... um Christopher Nolan, quem sabe... Aliás, ter Nolan à frente de um Quarteto Fantástico não é mesmo uma má ideia, por mais irrealizável que ela pareça ser.    

De qualquer forma, esse novo filme dos heróis não é tão ruim quanto se vem apregoando por aí, mesmo com todos seus problemas. É um tanto curioso, aliás, ver um bocado de fãs dos estúdios Marvel detonando o trabalho de Trank. O que o diretor fez aqui não destoa muito dos Homens de Ferro e afins que tantos idolatram hoje em dia. Neles também encontramos narrativas apressadas (Capitão América: O Primeiro Vingador, alguém?), pouco cuidado com os vilões (alguém se lembra de como Caveira Vermelha, Monge de Ferro e Whiplash foram sumariamente descartados, no primeiro Capitão América e nos dois primeiros Homem de Ferro, respectivamente?) e subaproveitamento de tramas interessantes. Ao menos o novo Quarteto Fantástico é um filme inteiro, com começo, meio e fim, e não um pedaço de um quebra-cabeças supostamente genial que nunca se completa. Mas... é melhor não discutir com marveletes, certo?  


Quarteto Fantástico 
Fantastic Four, 2015
Josh Trank

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