segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

[sobre avatar, o oscar e um certo bolo de chocolate]



Hoje revi Avatar, levado por 3 motivações diferentes: 1) finalmente assistir ao trabalho revolucionário de Cameron da forma como, segundo tantos, ele foi feito para ser apreciado, em 3D; 2) conferir se foi justa ou não a vitória na cerimônia do Globo de Ouro, na noite de ontem; 3) reforçar minha defesa do filme, do qual gostei na primeira ida ao cinema, em um debate com um amigo, que acha-o raso e maniqueísta. Em suma: assisti Avatar pela segunda vez com imensa predisposição para encontrar aqui a obra-prima que muitos vêm encontrando. Mas o resultado dessa segunda visita à Pandora não foi exatamente esse.


Sobre o 3D, não há o que reclamar, pelo contrário: Cameron utiliza-o na medida correta, simplesmente para embelezar plasticamente ainda mais as imagens que vemos na tela - não há objetos sendo atirados incessantemente contra o espectador, como muitos filmes que adotam o formato costumam fazer, e o que se tem aqui é uma experiência verdadeiramente mágica para os olhos. Assim, se o visual de Avatar em 2D já era um espetáculo...


O problema é que, dessa vez, o filme, enquanto cinema mesmo, simplesmente desmoronou na minha frente. Na primeira vez que o assisti já havia reconhecido todos os clichês, a pouca profundidade dramática, a semelhança excessiva com Dança com Lobos... mas se, naquela ocasião, a grandiosidade do feito de Cameron havia conseguido suplantar esses defeitos todos, agora simplesmente não deu. Avatar é esquemático do começo ao fim e constatar isso novamente torna-o extremamente irritante. A facilidade com que os Na'vi aceitam "estudar" o protagonista, por exemplo, esbarrando somente no ciúme (previsível) de um personagem, é completamente inverossímil. Nesse sentido, basta voltar a Dança com Lobos: era admirável a calma com que Costner desenvolvia o relacionamento entre o herói da Guerra Civil e os índios Sioux, a forte rejeição inicial, as incompreensões, a aproximação gradual, até a conquista do respeito total. No filme de Cameron, mesmo com suas quase 3 horas de duração, tudo é apressado e chato em sua pouca criatividade. O problema não é ser parecido com o filme de Kevin Costner, até porque Dança com Lobos é belíssimo. O problema é ser uma versão piorada dele – algo que havia acontecido também com O Último Samurai.


Vamos então aos prêmios: com a vitória nas duas principais categorias do Globo de Ouro, somada à sua impressionante bilheteria, Avatar parece ter tudo para seguir a trilha de Titanic e não deixar pedra sobre pedra no próximo Oscar. Caso essa previsão se confirme, será de fato uma grande injustiça, como foi injustiça o que ocorreu na noite de ontem. Principalmente porque entre os indicados pela imprensa estrangeira de Hollywood estavam duas obras-primas, que muito provavelmente também serão lembradas pela Academia: Guerra ao Terror e Bastardos Inglórios. Infelizmente, me parece que pedir um pouco de maturidade aos votantes do Oscar será um pouco demais – vai ser difícil resistir ao sucesso comercial arrasador, à revolução tecnológica, ao discurso ambientalista politicamente correto...


Sobre o debate com meu amigo, devo dizer que bati o pé, defendi o filme veementemente, ainda que reconhecendo alguns de seus problemas. Tal amigo apresentou-me então uma "teoria" para analisá-lo, segundo a qual, se um filme fosse um bolo de chocolate, James Cameron seria aquele sujeito que, sabendo que todo mundo gosta de bolos de chocolate (ou quase todo mundo, nunca se sabe), exagera na receita, reforça a quantidade de açúcar e de achocolatado, para torná-lo ainda mais apetitoso. A princípio, não dei muita atenção a esse parelelo. Agora, ele parece-me totalmente apropriado: é que existem determinados bolos e doces que, de tão açucarados, tornam-se enjoativos. Um pedaço basta para satisfazer quem os come. Como descobri hoje, esse é o caso de Avatar.


P.S.: ainda que não pareça, continuo gostando do filme. É uma ótima aventura, empolgante, e com algumas cenas muito boas. Só é superestimado.


P.S. 2: Stephen Lang está genial, é a melhor coisa de Avatar, de longe. Se não fosse Christoph Waltz, seria com certeza o melhor vilão do cinema em 2009.


3 comentários:

Amèlie Poulain disse...

Hahaha... Eu sempre achei Avatar meio clichê. Talvez porque eu fui com MUITA expectativa MESMO pro cinema... Provavelmente com a mesma que vc foi quando viu pela segunda vez. Agora, será que só eu que não acho Pandora esse must todo?

Wallace Andrioli Guedes disse...

O problema é que Pandora é muito natureba... como eu sou uma pessoa irritantemente urbana, ia achar um saco viver lá...

Rafael Carvalho disse...

Ts, ts, ts. Meus Deus, Avatar tem sido considerado melhor filme e melhor dirigido do que Bastardos Inglórios e Guerra ao Terror!!! Que sacrilégio. Apesar de gostar do filme, acho que é muito barulho em cima do projeto. Mas Hollywood é isso aí, money, money, art later.