terça-feira, 11 de junho de 2013

Faroeste Caboclo



Apesar de ter feito a cabeça de muitos jovens, inclusive a minha, "Faroeste caboclo" é uma canção repetitiva, enjoada e que, ao se pretender épica, afunda numa falta de verossimilhança e elegância que só não é pior que sua conclusão, típica da "consciência social" imatura de Renato Russo. Por isso, é realmente surpreendente que sua adaptação para o cinema tenha resultado num filme tão bom. 

Deixando de lado a grandiosidade tola e vazia da música que o inspirou, o roteiro de Faroeste Caboclo (da dupla Marcos Bernstein e Victor Atherino, também responsável pelo pavoroso Somos Tão Jovens) acerta ao construir seus personagens com cuidado, trafegando bem entre o estereótipo (os vilões de Felipe Abib e Antônio Calloni, ambos ótimos) e a complexidade (João de Santo Cristo é um anti-herói de ações facilmente condenáveis sob um olhar moralista, enquanto Maria Lúcia está longe de ser uma menina de comportamento padrão). Acerta também ao eliminar passagens inverossímeis da canção de Renato Russo (nada de senhor de alta classe com dinheiro na mão fazendo uma proposta indecorosa a João, nada de imprensa cobrindo o duelo final) e tornar outras mais coerentes (o envolvimento de Maria Lúcia com Jeremias, por exemplo), centrando suas atenções no romance entre o casal de protagonistas e na constante ameaça representada pela Abib / Calloni. E acerta, sobretudo, ao fazer uso da Brasília da década de 1980 para construir uma espécie de cartografia da desigualdade do espaço urbano, sem precisar, para isso, de didatismo ou de discursos artificialmente engajados.

Talvez o único pecado de Faroeste Caboclo esteja em seu epílogo, quando o diretor estreante Renê Sampaio tenta se aproximar demais de um western à lá Leone, destoando do clima de thriller ubano com pitadas de romance construído até ali. Mas como até essa homenagem ao mestre italiano é filmada com competência, o escorregão passa quase despercebido. E quando "Faroeste Caboclo", a música, surge durante os créditos finais, fica mais forte a sensação de que Sampaio fez um grande trabalho: seu filme é muito superior, enquanto narrativa, à fonte da qual provém.


Faroeste Caboclo 
Faroeste Caboclo, 2013
Renê Sampaio

3 comentários:

Leandro Matos disse...

Ahh, Sua análise do filme coincide com o que pensei ao assisti-lo. Mas doeu ler que "'Faroeste caboclo' é uma canção repetitiva, enjoada e que, ao se pretender épica" e tem uma "grandiosidade tola e vazia"... Eu não discordo totalmente de você não. Mas essa e outras musicas do Legião embalaram minha adolescência e lá nos idos dos anos 90, não analisava as musicas dessa forma! rsrs. Mas tenho que dar o braço a torcer e realmente o filme é muito melhor que a musica, principalmente por não apostar naquelas partes inverossímeis da letra, que não são poucas.

Wallace Andrioli Guedes disse...

"Faroeste caboclo" e outras músicas do Legião também embalaram minha adolescência, Leandro, e até hoje guardo um certo carinho por elas.

Bússola do Terror disse...

Ainda não vi o filme. Mas as críticas que encontrei até agora foram todas mais positivas.
Como seja, esse filme me parece uma tentativa muito mais bem sucedida do que outras já feitas há alguns anos por outros diretores (como o Alex Prado, com seus filmes sobre o personagem Gregório) pra criar um faroeste se passando no interior do Brasil.