Me parece que, ao filmar a história do brasileiro Jean Charles de Menezes, confundido com um terrorista e morto covardemente pela polícia inglesa em 2005, o diretor Henrique Goldman teria duas opções de foco narrativo: ou construía um thriller político, um filme-denúncia contra a atitude dos policiais ingleses e a não-punição destes até os dias de hoje (lá se vão 4 anos desde o ocorrido...), ou buscava um lado mais humano na história, indo além da biografia do personagem-título e focando no cotidiano dos imigrantes brasileiros em Londres. Goldman optou pela segunda, e acertou em cheio.
Também um brasileiro habitante da capital inglesa, o diretor demonstra enorme desenvoltura ao filmar o dia-a-dia daquelas pessoas, criando um painel delicado, ao mesmo tempo melancólico e bem-humorado, das condições em que vivem. Selton Mello acaba também se revelando um grande acerto: o ator (reconhecidamente talentoso, mas sofrendo de uma certa superexposição no cinema brasileiro atual), consegue ir além de sua típica caracterização de personagens simpáticos e engraçados, fazendo de seu Jean Charles uma figura um tanto verdadeira, absurdamente carismática sem que sua presença soe forçada. Se se imaginava que a escolha do ator para o papel poderia torná-lo "maior" que o retratado, fazendo-nos esquecer do verdadeiro Jean Charles, o que acaba ocorrendo é justamente o contrário, com Selton se colocando em uma posição extremamente respeitosa, de certa forma deixando seu talento dramático à serviço daquela trágica história e daquele trágico homem (Jean Charles de Menezes e sua vida são, em Jean Charles, sempre maiores, mais importantes, do que a interpretação de Selton Mello). E vale dizer também que a presença sempre graciosa da apaixonante Vanessa Giácomo também ajuda, e muito, tanto o desempenho do protagonista (já que o casal exibe uma ótima química em cena) quanto o filme em geral.
No entanto, como era de se imaginar, Jean Charles possui lá seus problemas. Se na maior parte do tempo a narrativa flui muito bem, sem nenhum grande tropeço (por mais que algumas presenças de não-atores chegue a incomodar em alguns momentos), quando esta dá a grande guinada, com a saída de Selton de cena e a consequente mudança de tom (não havendo mais espaço para bom-humor), o filme cai ladeira abaixo. Primeiramente, a própria cena do assassinato de Jean Charles é mal filmada, com uma estranha e despropositada câmera subjetiva, que acaba diminuindo o impacto do ocorrido. E, em seguida, há uma série de cenas passadas no Brasil que são bastante ruins. Daniel de Oliveira faz uma desnecessária e boba participação especial, e Jean Charles aproxima-se de um incômodo tom melodramático (por mais que, na sequência da visita das autoridades inglesas à família da vítima, a reação do personagem do ótimo Luís Miranda acabe por soar verdadeiramente comovente). Felizmente, porém, o que fica no final, é a sensação de que Goldman obteve êxito, ao optar por um filme de pequena escala, nada inovador, mas profundamente sincero. Sem dúvidas, poderia ser melhor, mas as recentes experiências de nosso cinema com filmes biográficos mostra que também poderia ser pior. O saldo, portanto, é positivo.
domingo, 28 de junho de 2009
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4 comentários:
Esse não me parece um filme, tão interessante, vou aguardar chegar na locadora!
Olá Wallace! Após mais um tempo sumido (justificado lá no blog), voltei a aparecer. Como diz o ditado: "quem é vivo, sempre aparece", hehehe.
Tenho interesse em assistir "Jean Charles", mas mais por causa do Selton Mello (há um tempinho que venho tentando acompanhar todas as novidades dele). Na verdade a história até me despertava a curiosidade, mas vendo você falando dessa opção do Goldman em explorar mais o lado humano dos pesonagens, com um enfoque menos sensacionalista, fiquei mais animado ainda. E você já é a terceira pessoa que vejo criticando um pouco o longa quando o Selton Mello sai de cena, que vai mais pra um tom melodramático e tal. Espero que isso não me incomode tanto.
Abraço!
Sabe que eu comprei ingresso pra ver ele, aí quebrou o projetor da sala (sim, em pleno multiplex!) e eu tive que trocar por Transformers. Enfim, tá lá a crítica no blog. Não sei se fiz uma boa troca... Mas não desisti dele ainda!
Não esperava muito, então sua crítica foi animadora. Acho que ao menos pelo elenco deve valer a pena, Selton Mello é sempre ótimo.
Teve selo pra você lá no blog!
Ciao!
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