quinta-feira, 23 de abril de 2009

[angels in america]

Angels in America
Angels in America, 2003
Mike Nichols


Angels in America é uma das séries (no caso, mini-série) mais premiadas que a TV norte-americana já produziu. Assistindo-a, não é muito difícil perceber o porquê: elenco primoroso (Al Pacino, Meryl Streep, Emma Thompson, Patrick Wilson, Mary-Louise Parker, Jeffrey Wright) absolutamente inspirado, história emocionante, acerca de um tema polêmico e doloroso (o surgimento da AIDS nos EUA na década de 1980, e seu efeito especialmente sobre os homossexuais), e uma bem-vinda mistura entre realidade dramática e o fantástico. No entanto, há problemas nessa obra grandiosa de Mike Nichols.
Primeiramente, por mais que o elenco esteja, em geral, sublime, alguns atores são, de certa forma, sabotados por personagens fracos e/ou irritantes. Emma Thompson talvez seja o caso mais sintomático disso. Interpreta três personagens, no entanto, só um deles impressiona realmente: a mendiga. E é um papel pequeno. Sua enfermeira também não pode fazer muito em cena, também privada de tempo, enquanto o Anjo da América beira o ridículo, com seus exageros histriônicos. Mary-Louise Parker também dá vida a uma figura que, se por um lado é comovente, e de enorme importância para a trama, por outro se torna extremamente irritante em muitos momentos. Já Jeffrey Wright dá a sorte de compensar o bobo Mr. Lies com um estupendo desempenho como o enfermeiro homossexual Belize. Talvez Parker precisasse de mais uma personagem, como Wright, para demonstrar o quanto é boa atriz.
Em compensação, o trio Patrick Wilson, Ben Shenkman e Justin Kirk está excepcional, constituindo um triângulo amoroso tocante; eles são os verdadeiros protagonistas de Angels in America, e, como tais, não decepcionam em nada. Wilson talvez seja o principal destaque dos três, com sua insuportável e transbordante angústia, seu desejo de ser quem realmente é entrando em conflito com sua carapaça conservadora mórmon. Por fim, há Al Pacino e Meryl Streep. A atriz tem quatro papéis (sendo um, absurdamente inusitado, e outro, extremamente curto), mas impressiona realmente em dois: como a conservadora e austera mãe de Patrick Wilson, que aos poucos descobre a possibilidade de viver com o diferente a partir da experiência vivida com seu próprio filho, e o fantasma de Ethel Rosenberg. E é aqui que entra Pacino. Nas aparições de Ethel, a dinâmica entre esses dois monstros da interpretação é absolutamente perfeita, irretocável, gerando, por fim, uma maravilhosa cena tragicômica em um hospital. No entanto, mesmo quando Streep não está ao seu lado, Pacino justifica completamente a alcunha de monstro do cinema. Transforma um papel que, a princípio, parece reiterar tudo o que o ator vem fazendo nos últimos anos (o sujeito megalomaníaco, que grita e esbraveja a todo momento, e que está em busca de um "sucessor"), em um retrato decadente de uma faceta do conservadorismo da sociedade norte-americana, que comove profundamente. Al Pacino interpreta apenas um personagem. Mas engole todos os outros atores e atrizes que o cercam de uma forma assustadora.
Mas nem só de elenco vive Angels in America, e aí entram alguns outros problemas da mini-série. A inserção do elemento fantástico em sua narrativa, se funciona maravilhosamente no caso de Ethel Rosenberg, descamba para um lado que beira a comicidade quando envolve a figura angelical de Emma Thompson, o que, sem dúvidas, não era a intenção de Nichols. Vê-la mantendo relação sexual com Justin Kirk, flutuando, por exemplo, parece totalmente desnecessário, assim como ver Meryl Streep combatendo-a num quarto de hospital na parte final da história. Além disso, como já dito, outra figura fantástica, o Mr. Lies de Jeffrey Wright, também parece possuir uma existência despropositada, e o passeio final do personagem de Kirk pelo paraíso, debatendo com uma espécie de "conferência de anjos" também irrita.
E há ainda o final. Personagens falando diretamente com a câmera, dando uma lição de moral acerca de tudo o que foi mostrado anteriormente, definitivamente não combina com a jornada dramaticamente poderosa que é Angels in America. Mas, infelizmente, Nichols e o roteirista Tony Kushner fazem essa opção, e terminam esse grande trabalho da pior maneira possível.

5 comentários:

Rafael Carvalho disse...

Ué Wallace, pelo seu texto parece que você odiou o filme. Sempre tive curiosidade de ver.

Wallace Andrioli Guedes disse...

Não, Rafael, eu gostei bastante. Mas algumas coisas realmente me incomodaram, e acho que acabei dando muito realce a elas.

Anônimo disse...

É... tem mini-séries (filmes, seriados, etc) que a gente curte bastante mas que não podemos deixar de ver suas falhas.

Angels in America é algo que eu sempre quis assistir, justamente por ser bem aclamado. Se duvidar aproveito o próximo feriado que tá vindo pra dar uma conferida.

Valeu a dica cara, abraço!

Anônimo disse...

Apesar de não ter elogios válidos como 4-estrelas, seus comentários só apimentaram mais minha curiosidade pela mini-série, que se deve mais mesmo ao elenco e ao diretor.

Ciao!

- cleber . disse...

Já revireei tudo quanto foi lugar para achar este, e não consegui!