Talvez seja preciso ter um mínimo interesse pelo contexto político dos anos 70 para viver de forma plena a intensidade da experiência que é assistir Carlos. Isso porque, com suas 5h30 de duração, o filme de Olivier Assayas poderia facilmente tornar-se enfadonho para quem não é familiarizado com o assunto, com seu sem número de personagens, organizações políticas e respectivas siglas. Por ser um apaixonado por tal período e nutrir grande interesse pelos meandros da política não-institucional de então (leia-se: organizações da esquerda armada), me encantei totalmente com o trabalho realizado por Assayas.
Mas mesmo para o mais completo leigo em política da década de 1970, Carlos pode se tornar interessante, graças principalmente ao seu protagonista e à capacidade de Assayas em manter a narrativa sempre em alto nível, poucas vezes deixando seu ritmo cair - algo absolutamente espantoso para um filme tão longo. É impressionante, por exemplo, como o diretor filma a sequência do sequestro dos ministros da OPEP, ação pela qual Carlos ficou internacionalmente famoso. Do cuidadoso planejamento, escolha dos participantes, à execução do sequestro, toda a sequência toma quase 1 hora do filme, mas é conduzida com tamanho cuidado por Assayas - que cria uma atmosfera de tensão crescente que absorve totalmente a atenção do espectador, sem ter de, para isso, apelar para câmeras tremendo ou cortes rápidos - que, quando chega ao fim, a sensação é de que apenas uns 10 minutos se passaram.
Quanto ao protagonista, Carlos, o Chacal, terrorista internacional, militante de esquerda, mercenário, é uma figura suficientemente interessante para carregar, por si só, qualquer longa. No entanto, a forma como o personagem é construído aqui, sem nenhum julgamento moral explícito ou glamourização a priori, torna-o uma das figuras criminosas mais interessantes da história do cinema. Admirar ou detestar o verdadeiro Carlos é, antes de qualquer coisa, uma questão de posicionamento político. Entretanto, não se encantar com o Carlos ficcional do filme de Assayas é praticamente impossível, e, volto a dizer, não porque o diretor busque torná-lo heroico. Graças à própria grandiosidade do personagem e de sua trajetória, unida ao desempenho estupendo de Édgar Ramirez, o Carlos de Olivier Assayas se torna figura comparável, em matéria de fascínio exercido sobre o espectador, a, por exemplo, qualquer membro da família Corleone. O que, convenhamos, não é pouco. Carlos, então, extrapola qualquer nicho reduzido de público (interessado meramente em política) para tornar-se uma obra-prima grandiosa, saga criminosa que realmente merece ser colocada, com todas as suas particularidades, ao lado de obras como O Poderoso Chefão, Era Uma Vez na América, Os Bons Companheiros...
Carlos
Carlos, 2010
Olivier Assayas
Olivier Assayas
5 comentários:
baixarei já!
Desconfio que você vai gostar demais, Heitor.
Depois dos muitos elogios lidos e da vitória surpreendente no Golden Globes, quero muito conferir "Carlos".
Eu quero conferir, acho que a premissa é bem instigante. Parabéns pelo texto! abraço
É preciso muita coragem para encarar mais de 5 horas de filme. Mas quase todo mundo tem se mostrado recompensado pela experiência. Tentarei ver logo, logo.
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