terça-feira, 21 de agosto de 2012



[festival varilux de cinema francês 2012 - parte 2]

 My Way - O Mito Além da Música 
CloClo / My Way, 2012
Florent-Emilio Siri


Até o momento em que seu protagonista, Claude François, obtém êxito em sua busca pelo sucesso, My Way parece ser um filme fadado ao fracasso. Ritmo acelerado e cenas dispensáveis da infância e juventude do personagem dão o tom nessa primeira parte da narrativa. Mas basta François chegar ao estrelato para o filme de Florent-Emilio Siri se fortalecer absurdamente. O diretor mergulha com intensidade no universo colorido do personagem, na sua vida frenética de shows, gravação de videoclipes, festas e mulheres, muitas mulheres, construindo uma espécie de soft Boogie Nights, com direito a alguns belos planos-sequências. Siri consegue imprimir a My Way a estética brega de seu protagonista, afastando-se do excesso de sobriedade que costuma marcar cinebiografias como essa. E a cereja no bolo dessa agradável surpresa é Jeremie Renier, numa interpretação apaixonada e apaixonante, diretamente responsável por alguns dos melhores momentos do filme (especialmente aqueles que envolvem Frank Sinatra).


O Monge 
Le Moine, 2011
Dominik Moll



O maior mérito de O Monge é abraçar, sem restrições, as crenças do mundo que retrata. O diretor Dominik Moll não tenta, em nenhum momento, racionalizar os eventos que compõem sua história, criando um doloroso conto cristão sobre tentação, pecado e culpa. Com uma atmosfera de terror psicológico que carrega de tensão a narrativa e aprofunda a sensação de ausência do sagrado justamente onde ele deveria estar mais presente, remetendo diretamente a alguns trabalhos de Ingmar Bergman (Luz de Inverno, por exemplo), O Monge é um filme tenso, envolvente e instigante, perpassado por um estranhamento que encontra eco até mesmo na presença inusitada de um contido (e estupendo) Vincent Cassel no papel principal.

domingo, 19 de agosto de 2012


[festival varilux de cinema francês 2012 - parte 1]

Intocáveis 
Intouchables, 2011
Eric Toledano & Olivier Nakache


O maior sucesso de bilheteria da França no ano passado (mais de 20 milhões de espectadores) é um filme simpático, comovente em alguns momentos e engraçado em muitos outros. Aborda o cotidiano de um personagem tetraplégico sem a sensibilidade de obras como Mar Adentro ou O Escafandro e a Borboleta mas, por outro lado, tem o enorme mérito de não descambar para o sentimentalismo barato, apesar de vez ou outra passar perto disso. Talvez a aposta no humor tenha sido um dos grandes acertos dos diretores Eric Toledano e Olivier Nakache, permitindo um certo distanciamento da densidade dramática geralmente exigida de uma história como essa. Intocáveis é, em suma, um filme simples, discreto, agradável e que se beneficia demais de seus atores, especialmente de Omar Sy, um verdadeiro vulcão de carisma.


Polissia 
Polisse, 2011
Maïwenn


Esse aqui é uma porrada. A diretora Maïwenn ficcionaliza (baseando-se em pesquisa de campo) o dia-a-dia de uma divisão da polícia de Paris responsável por crimes contra menores de idade e acaba criando alguns momentos de imensa força dramática. Cada novo caso de pedofilia ou violência contra crianças que surge na tela é como um soco no estômago do espectador, pela visceralidade que Maïwenn, com sua estética seca, consegue imprimir aos seus personagens. Só é uma pena que a diretora insista em também ser atriz do filme, inserindo na trama uma personagem boba, insossa e que, ao estabelecer uma relação amorosa com o personagem do excepcional Joey Starr, acaba por criar o único laço de inverossimilhança numa narrativa carregada de veracidade.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge



Os êxitos consecutivos (tanto nas bilheterias quanto entre a crítica especializada) de Batman - O Cavaleiro das Trevas e A Origem consolidaram Christopher Nolan como um dos cineastas mais influentes da atualidade. A seriedade e o realismo que imprimiu ao universo de um super-herói como o Batman, por exemplo, acabou por tornar-se uma espécie de padrão de qualidade a ser seguido, inclusive credenciando Nolan ao posto de "padrinho" de outros filmes baseados em personagens dos quadrinhos, caso do Superman que Zack Snyder lançará em 2013.

Mas nem tudo são flores e há um preço a se pagar por ser, hoje, Christopher Nolan. Cada novo filme seu é recebido sob um clima de ame-o ou deixe-o; há quem considere o cineasta um novo Stanley Kubrick, há quem o veja como um picareta com pouco, ou nenhum, talento. A acolhida a Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge não fugiu muito a essa regra: enquanto muitos amaram, considerando o filme o encerramento perfeito para a saga do herói nas telas, outros tantos detestaram, resgatando do limbo até mesmo o infame Batman & Robin, de Joel Schumacher, para criticarem o olhar de Nolan para o personagem. A meu ver, um pouco mais de parcimônia não faria mal a ninguém.

De fato, Christopher Nolan não é nenhum gênio, nenhum sucessor de Kubrick. Seus filmes têm problemas crônicos, principalmente no que diz respeito a um excesso de didatismo que pauta suas narrativas - algo que incomoda bastante tanto em A Origem como nesse novo Batman. Trata-se de uma necessidade de explicar tudo o que está acontecendo na tela, seja através de flashbacks ou de discursos artificiais dos personagens, o que não deixa de ser uma forma de subestimar a inteligência do espectador. Em O Cavaleiro das Trevas Ressurge há alguns exemplos nesse sentido: o personagem que revela, oralmente sua verdadeira natureza e todos os passos de seu plano; a câmera que mostra coisas que poderiam ser simplesmente sugeridas; o flashback que explica o que já entendemos.

Mas, aparadas essas arestas, sobra um filme de qualidades inegáveis, quase tão impecável quanto O Cavaleiro das Trevas. O diretor, ao lado de seu irmão e parceiro habitual Jonathan Nolan, consegue, mais uma vez, construir uma narrativa que impressiona pela grandiosidade, mas que jamais deixa de se preocupar com o desenvolvimento de seus personagens. Tomemos como exemplo os antagonistas Batman/Bruce Wayne e Bane: o primeiro continua sendo uma figura complexa, quase esquizofrênica, um homem amargurado e, ao que parece, viciado no vigilantismo que pratica; já o segundo é, no fim das contas, o líder de uma espécie de revolução que põe fim aos privilégios das elites de Gotham e muda substancialmente a configuração social da cidade, o que o torna, por si só, um sujeito admirável (ao mesmo tempo que levanta questões sobre os significados políticos de um personagem como Batman, mantenedor supremo do status quo, bilionário que lida com seus demônios garantindo a permanência do poder do Estado e de seu braço armado, a polícia).

Ou seja, por mais que, enquanto espectadores, não hesitemos em torcer por aquele que nos é apresentado como herói, os irmãos Nolan conseguem fugir de dicotomias excessivas simplórias, imprimindo bem-vindos tons de cinza na composição de seus personagens. Isso é algo que Joel Schumacher, com sua Gotham City carnavalesca, passou longe de fazer; esse é um mérito que ninguém tira de Christopher Nolan.


Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge 
The Dark Knight Rises, 2012
Christopher Nolan