sábado, 19 de novembro de 2011


[o palhaço]

O Palhaço
O Palhaço, 2011
Selton Mello


O Palhaço é um filme, digamos, "tchuco". Apesar de seguir num registro melancólico, Selton Mello constrói aqui uma narrativa bastante diferente da de Feliz Natal, sua pesada estreia na direção de longa-metragens. Há uma contagiante doçura no olhar que o diretor lança sobre as figuras que povoam seu filme, realçando para o espectador o forte senso de família que une aqueles personagens. No cinema brasileiro, talvez a referência mais próxima seja a Caravana Rolidei de Bye Bye Brasil (ainda que o filme de Diegues me pareça bem mais pessimista); internacionalmente, penso, num primeiro momento, na trupe de dançarinas de cabaré e seu empresário, do recente Turnê, de Mathieu Amalric. Trata-se da velha história do grupo de personagens mambembes, maltrapilhos, destruídos pela vida, que encontram no convívio com eles próprios razões para seguir adiante, para enxergar felicidade em condições de existência bastante degradantes.
O centro emocional de O Palhaço é Benjamin/Pangaré, personagem interpretado com esmero pelo próprio Selton Mello. Sua tristeza transbordante serve como uma espécie de respiro para o espectador diante de tamanha miséria mostrada - já que tamanha melancolia significa, na verdade, inconformismo, ainda que parcamente manifestado. A trajetória dos componentes do circo Esperança é pontuada por episódios e figuras bizarras - a começar pelos próprios personagens, quase todos próximos de uma representação tragi-cômica/grotesca -, e é, portanto, totalmente identificável para o espectador a vontade que Benjamin sente de largar aquela vida. O filme parece ser todo pontuado por essa tensão: desejo de mudança do protagonista versus reconhecimento do amor que perpassa as relações entre aqueles personagens. E a forma como Selton resolve esse embate é, ainda que óbvia, dotada de imensa beleza. A sequência final serve para nos lembrar que, no fim das contas, é com os nossos iguais que podemos mesmo contar - e poucos momentos no cinema esse ano foram tão tocantes quanto aquele do reencontro entre os personagens de Mello e do grande Paulo José: numa troca de olhares e num tocar de narizes de palhaço, parece caber todos os sentimentos do mundo.