quarta-feira, 5 de setembro de 2012


[360]

360 
360, 2011
Fernando Meirelles


Me agrada muito o caminho tomado pelo cinema de Fernando Meirelles. Ao invés de investir numa carreira hollywoodiana, após o imenso sucesso internacional de Cidade de Deus e dos muitos elogios e indicações a prêmios de O Jardineiro Fiel, ou de seguir no Brasil fazendo filmes para o grande público, o cineasta optou por comandar produções médias, financiadas por investidores europeus e protagonizadas por elencos multinacionais, tendo sempre em foco uma bem-vinda autonomia artística. Feito dentro dessa lógica, 360, novo filme de Meirelles, é uma agradável surpresa.
Longe da ambição temática de um Ensaio sobre a Cegueira, por exemplo, o diretor filma com elegância e delicadeza o roteiro de Peter Morgan que, confesso, me encantou. Apesar de ser mais um filme com várias histórias que se cruzam, 360 é, se observamos bem, quase um anti-Babel (ou anti-Crash). Não há em sua narrativa a necessidade de encadear atos que se determinam, muitas vezes de maneira um tanto forçada, de acordo com aquela irritante e batida noção de que estamos todos conectados. Na verdade, Morgan aposta numa estrutura de hiperlinks, com uma história que se abre para outra que, por sua vez, se abre para outra, e assim por diante. Meirelles, por sua vez, demonstra sua sensibilidade habitual para lidar com dramas humanos, dando um tratamento carinhoso a cada um de seus personagens - me comoveu particularmente a figura do motorista/guarda-costas russo (interpretado por Vladimir Vdovichenkov) que, em poucos instantes, passa de marido insensível ao sofrimento da esposa a homem cheio de frustrações pelos caminhos escolhidos, mas ainda capaz de sonhar com uma vida diferente. Talvez 360 seja mesmo, como muitos vêm apontando, um trabalho menor de Fernando Meirelles. Mas que grande cineasta é esse brasileiro, que pode ter como parte menor e desimportante de sua filmografia uma obra tão bem dirigida e tão agradável de se assistir.

terça-feira, 21 de agosto de 2012



[festival varilux de cinema francês 2012 - parte 2]

 My Way - O Mito Além da Música 
CloClo / My Way, 2012
Florent-Emilio Siri


Até o momento em que seu protagonista, Claude François, obtém êxito em sua busca pelo sucesso, My Way parece ser um filme fadado ao fracasso. Ritmo acelerado e cenas dispensáveis da infância e juventude do personagem dão o tom nessa primeira parte da narrativa. Mas basta François chegar ao estrelato para o filme de Florent-Emilio Siri se fortalecer absurdamente. O diretor mergulha com intensidade no universo colorido do personagem, na sua vida frenética de shows, gravação de videoclipes, festas e mulheres, muitas mulheres, construindo uma espécie de soft Boogie Nights, com direito a alguns belos planos-sequências. Siri consegue imprimir a My Way a estética brega de seu protagonista, afastando-se do excesso de sobriedade que costuma marcar cinebiografias como essa. E a cereja no bolo dessa agradável surpresa é Jeremie Renier, numa interpretação apaixonada e apaixonante, diretamente responsável por alguns dos melhores momentos do filme (especialmente aqueles que envolvem Frank Sinatra).


O Monge 
Le Moine, 2011
Dominik Moll



O maior mérito de O Monge é abraçar, sem restrições, as crenças do mundo que retrata. O diretor Dominik Moll não tenta, em nenhum momento, racionalizar os eventos que compõem sua história, criando um doloroso conto cristão sobre tentação, pecado e culpa. Com uma atmosfera de terror psicológico que carrega de tensão a narrativa e aprofunda a sensação de ausência do sagrado justamente onde ele deveria estar mais presente, remetendo diretamente a alguns trabalhos de Ingmar Bergman (Luz de Inverno, por exemplo), O Monge é um filme tenso, envolvente e instigante, perpassado por um estranhamento que encontra eco até mesmo na presença inusitada de um contido (e estupendo) Vincent Cassel no papel principal.

domingo, 19 de agosto de 2012


[festival varilux de cinema francês 2012 - parte 1]

Intocáveis 
Intouchables, 2011
Eric Toledano & Olivier Nakache


O maior sucesso de bilheteria da França no ano passado (mais de 20 milhões de espectadores) é um filme simpático, comovente em alguns momentos e engraçado em muitos outros. Aborda o cotidiano de um personagem tetraplégico sem a sensibilidade de obras como Mar Adentro ou O Escafandro e a Borboleta mas, por outro lado, tem o enorme mérito de não descambar para o sentimentalismo barato, apesar de vez ou outra passar perto disso. Talvez a aposta no humor tenha sido um dos grandes acertos dos diretores Eric Toledano e Olivier Nakache, permitindo um certo distanciamento da densidade dramática geralmente exigida de uma história como essa. Intocáveis é, em suma, um filme simples, discreto, agradável e que se beneficia demais de seus atores, especialmente de Omar Sy, um verdadeiro vulcão de carisma.


Polissia 
Polisse, 2011
Maïwenn


Esse aqui é uma porrada. A diretora Maïwenn ficcionaliza (baseando-se em pesquisa de campo) o dia-a-dia de uma divisão da polícia de Paris responsável por crimes contra menores de idade e acaba criando alguns momentos de imensa força dramática. Cada novo caso de pedofilia ou violência contra crianças que surge na tela é como um soco no estômago do espectador, pela visceralidade que Maïwenn, com sua estética seca, consegue imprimir aos seus personagens. Só é uma pena que a diretora insista em também ser atriz do filme, inserindo na trama uma personagem boba, insossa e que, ao estabelecer uma relação amorosa com o personagem do excepcional Joey Starr, acaba por criar o único laço de inverossimilhança numa narrativa carregada de veracidade.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge



Os êxitos consecutivos (tanto nas bilheterias quanto entre a crítica especializada) de Batman - O Cavaleiro das Trevas e A Origem consolidaram Christopher Nolan como um dos cineastas mais influentes da atualidade. A seriedade e o realismo que imprimiu ao universo de um super-herói como o Batman, por exemplo, acabou por tornar-se uma espécie de padrão de qualidade a ser seguido, inclusive credenciando Nolan ao posto de "padrinho" de outros filmes baseados em personagens dos quadrinhos, caso do Superman que Zack Snyder lançará em 2013.

Mas nem tudo são flores e há um preço a se pagar por ser, hoje, Christopher Nolan. Cada novo filme seu é recebido sob um clima de ame-o ou deixe-o; há quem considere o cineasta um novo Stanley Kubrick, há quem o veja como um picareta com pouco, ou nenhum, talento. A acolhida a Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge não fugiu muito a essa regra: enquanto muitos amaram, considerando o filme o encerramento perfeito para a saga do herói nas telas, outros tantos detestaram, resgatando do limbo até mesmo o infame Batman & Robin, de Joel Schumacher, para criticarem o olhar de Nolan para o personagem. A meu ver, um pouco mais de parcimônia não faria mal a ninguém.

De fato, Christopher Nolan não é nenhum gênio, nenhum sucessor de Kubrick. Seus filmes têm problemas crônicos, principalmente no que diz respeito a um excesso de didatismo que pauta suas narrativas - algo que incomoda bastante tanto em A Origem como nesse novo Batman. Trata-se de uma necessidade de explicar tudo o que está acontecendo na tela, seja através de flashbacks ou de discursos artificiais dos personagens, o que não deixa de ser uma forma de subestimar a inteligência do espectador. Em O Cavaleiro das Trevas Ressurge há alguns exemplos nesse sentido: o personagem que revela, oralmente sua verdadeira natureza e todos os passos de seu plano; a câmera que mostra coisas que poderiam ser simplesmente sugeridas; o flashback que explica o que já entendemos.

Mas, aparadas essas arestas, sobra um filme de qualidades inegáveis, quase tão impecável quanto O Cavaleiro das Trevas. O diretor, ao lado de seu irmão e parceiro habitual Jonathan Nolan, consegue, mais uma vez, construir uma narrativa que impressiona pela grandiosidade, mas que jamais deixa de se preocupar com o desenvolvimento de seus personagens. Tomemos como exemplo os antagonistas Batman/Bruce Wayne e Bane: o primeiro continua sendo uma figura complexa, quase esquizofrênica, um homem amargurado e, ao que parece, viciado no vigilantismo que pratica; já o segundo é, no fim das contas, o líder de uma espécie de revolução que põe fim aos privilégios das elites de Gotham e muda substancialmente a configuração social da cidade, o que o torna, por si só, um sujeito admirável (ao mesmo tempo que levanta questões sobre os significados políticos de um personagem como Batman, mantenedor supremo do status quo, bilionário que lida com seus demônios garantindo a permanência do poder do Estado e de seu braço armado, a polícia).

Ou seja, por mais que, enquanto espectadores, não hesitemos em torcer por aquele que nos é apresentado como herói, os irmãos Nolan conseguem fugir de dicotomias excessivas simplórias, imprimindo bem-vindos tons de cinza na composição de seus personagens. Isso é algo que Joel Schumacher, com sua Gotham City carnavalesca, passou longe de fazer; esse é um mérito que ninguém tira de Christopher Nolan.


Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge 
The Dark Knight Rises, 2012
Christopher Nolan

terça-feira, 17 de julho de 2012

O Espetacular Homem-Aranha



Definitivamente, a tarefa de O Espetacular Homem-Aranha não é fácil: reiniciar uma franquia cinematográfica que, encerrada há apenas cinco anos, fincou raízes no imaginário popular, mesmo que seu último filme não seja exatamente um primor de realização. E ainda que o resultado alcançado por Marc Webb, diretor do ótimo (500) Dias com Ela, seja satisfatório, a sombra dos filmes de Sam Raimi parece pairar sobre seu trabalho.

Nesse sentido, por mais que Andrew Garfield seja um ótimo ator e abrace com competência a proposta de apresentar Peter Parker como um adolescente moderno e tímido, Tobey Maguire e seu retrato caricatural, mas cativante, do personagem continuam como referência incontornável. Por mais que o roteiro de James Vanderbilt, Alvin Sargent e Steve Kloves se proponha a ser mais fiel aos quadrinhos, trazendo Gwen Stacy (Emma Stone, num bom desempenho) como o primeiro amor de Parker, a Mary Jane de Kirsten Dunst faz falta. Por mais que exista uma tentativa de respeitar certa mitologia do Homem-Aranha, trazendo vilões clássicos, interligando-os e deixando pistas para possíveis continuações, é difícil acreditar realmente que Webb conseguirá substituir à altura o Duende Verde de Willem Dafoe e, principalmente, o Dr. Octopuss de Alfred Molina – e a própria composição do Lagarto (Rhys Ifans) como um vilão genérico representado uma ameaça genérica ao herói e à cidade de Nova York alimenta essa descrença. 

Conclusões possíveis: ou Raimi e Maguire criaram algo verdadeiramente icônico, difícil de ser esquecido e superado (o que não é nenhum absurdo de se pensar quando levados em conta apenas os dois primeiros filmes da trilogia); ou simplesmente ainda é cedo demais para o cinema recontar a história do Homem-Aranha. Não que a Marvel – interessada tanto em retomar uma franquia lucrativa por si só quanto em trazer de volta um de seus maiores personagens para provavelmente inseri-lo numa continuação do megassucesso Os Vingadores – se importe realmente com isso.

O Espetacular Homem-Aranha 
The Amazing Spider-Man, 2012
Marc Webb

domingo, 8 de julho de 2012

[deus da carnificina]


Deus da Carnificina 
Carnage, 2011
Roman Polanski


Roman Polanski era mesmo a escolha mais óbvia para dirigir um projeto como essa adaptação da peça Dieu du Carnage, de Yasmina Reza. Afinal, o diretor franco-polonês já demonstrou ser capaz de explorar magnificamente espaços fechados em sua célebre "trilogia do apartamento" e no ótimo A Morte e a Donzela. Por isso, é uma pena que Deus da Carnificina não seja o filme memorável que prometia ser. Provavelmente a culpa nem é tanto de Polanski - que faz seu trabalho com competência, comandando um cast talentoso em atuações cruas e carregadas de ironia -, mas do próprio texto adaptado.
Isso porque, por mais que todo o processo de ruptura com as convenções sociais vivido pelos quatro personagens funcione muito bem na tela, o filme peca justamente ao interrompê-lo quando começava a ganhar contornos mais explosivos. Assistir a John C. Reilly e Jodie Foster deixar de lado as aparências de casal médio americano feliz e lavar a roupa suja na frente de estranhos; ou a Christoph Waltz (mais uma vez encarnando uma figura extremamente sarcástica) e Kate Winslet se ofendendo mutuamente sem pudores, é um verdadeiro prazer - talvez meio sádico, é verdade. No entanto, por encerrar sua narrativa antes que coisas mais traumáticas aconteçam, Deus da Carnificina perde a chance de ser um novo Quem Tem Medo de Virginia Woolf?, para tornar-se apenas um bom exercício de direção de atores. Levando-se em conta os envolvidos no filme, seria de se esperar muito mais. 

quinta-feira, 28 de junho de 2012


[5 filmes aguardadíssimos]

Amour, de Michael Haneke


Cosmopolis, de David Cronenberg


The Master, de Paul Thomas Anderson


Django Unchained, de Quentin Tarantino


Batman - O Cavaleiro das Trevas Ressurge, de Chistopher Nolan