sexta-feira, 9 de outubro de 2009

[festival do rio 2009: boletim 7]

Sede de Sangue
Bak-Jwi, 2009
Chan-Wook Park


Um filme sobre um padre que se transforma em vampiro, dirigido pelo mesmo sujeito que fez a obra-prima Oldboy tinha tudo para ser uma pérola. Não foi a toa que Sede de Sangue sempre figurou entre os filmes desse Festival que mais aguardava. Imensa expectativa, frustração maior ainda. É impressionante como tudo dá errado no filme de Chan-Wook Park. Ele parece não saber onde quer chegar, misturando história de vampiro (cuja origem é explicada de forma muito apressada), comédia familiar e um triângulo amoroso bizarro, sendo o resultado algo indefinível, mas impossível de se apreciar. O que mais irrita, na verdade, é o tom exageradamente cômico que o diretor dá ao filme - se em algumas obras recentes, e de alta qualidade, do cinema sul-coreano, como o próprio Oldboy, O Hospedeiro e Mother, o humor foi utilizado numa medida exata, aqui ele é levado a um extremo incômodo, beirando o pastelão, algo que simplesmente não tem a ver com aquela história contada. Daí, tudo fica pela metade: o drama do protagonista, o embate entre sua fé e os atos que passa a ter de cometer, sua relação com o sexo, e mesmo a história de amor que move a narrativa. Sai qualquer possibilidade de desenvolver um desses pontos com maior cuidado para entrar um bizarro grupo de personagens secundários, responsáveis pela comicidade de Sede de Sangue, e que só servem para fazer tudo desandar. Foi, de longe, a maior decepção desse Festival do Rio. Uma pena. Se antes de Sede de Sangue, me interessava de imediato por qualquer coisa feita por Chan-Wook Park, agora já estou revendo meus conceitos.


Five Minutes of Heaven
Five Minutes of Heaven, 2009
Oliver Hirschbiegel


Não sei se seria precipitado dizer que o tema das disputas político-religiosas na Irlanda nas últimas décadas está esgotado para o cinema, mas é fato que fica difícil dizer algo de novo depois dos olhares de gente como Jim Sheridan (Em Nome do Pai) e Paul Greengrass (Domingo Sangrento). Oliver Hirschbiegel, um alemão (!), tentou com esse Five Minutes of Heaven, mas não conseguiu muita coisa. A premissa do filme é, na realidade, bastante promissora, no entanto, a verdade é que Five Minutes of Heaven não tem lá muito a dizer. É curto demais, tem um James Nesbitt estranhamente exagerado, fora do tom dramático que a história pede (e o contraponto com a precisão da composição de Liam Neeson torna isso bem mais claro), e ainda desperdiça a excepcional Anamaria Marinca (de 4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias) em um papel minúsculo. Hirschbiegel até constrói algumas cenas interessantes, especialmente quando trabalha a tensão pré-encontro dos protagonistas diante das câmeras de TV, o que também não deixa de ser um avanço na carreira de alguém que fez um filmaço como A Queda, mas que logo depois fez aquela bomba chamada Invasores. No entanto, é pouco. É pouco para um diretor que, sem dúvidas, já foi melhor, e é pouco para um tema que já foi explorado com resultados muito melhores pelo cinema.

[festival do rio 2009: boletim 6]

An Education
An Education, 2009
Lone Scherfig


Carey Mulligan, além de ser uma graça, é uma ótima atriz. E Alfred Molina está inspiradíssimo como o pai da protagonista, numa das melhores interpretações de sua carreira - ao menos é uma das mais bem-humoradas, construindo um personagem que beira o irresistível. No entanto, não consigo ver mais motivos para todo o hype em torno desse An Education (que, ao que parece, no Brasil receberá o título absurdo de Sedução), inclusive credenciando-o como um dos favoritos ao próximo Oscar. É um filme correto sobre juventude, sobre as descobertas de uma garota em sua passagem para a vida adulta, mas nada mais que isso. Está tudo lá em seu devido lugar: o pai tradicionalista mas de bom coração, a mãe disposta a ajudar a filha, fazendo um contraponto ao marido, o amor romântico que revelará não ser apenas isso, causando algumas frustrações importantes para o amadurecimento da garota. Nada que não já se tenha visto antes. Ou seja, é um filme simpático, gostoso de se assistir, com uma protagonista ótima, mas que, com seu clima exageradamente up (esperava algo bem mais denso, confesso), não consegue ser muito mais do que isso. Nada original. Uma pena, já que um tom mais sério poderia tornar essa história bem mais marcante. Caso ganhe algo no Oscar, será mais um equívoco para a já longa conta da Academia.


The Burning Plain
The Burning Plain, 2008
Guillermo Arriaga


Acho que Guillermo Arriaga está precisando repensar um pouco sua atuação no cinema. Com sua bem-sucedida parceria com Alejandro González Iñarritu rompida - parceria que, ou mal ou bem, resultou em alguns bons filmes, sendo Amores Brutos o melhor deles - Arriaga opta por estrear na direção com uma história sua que simplesmente segue a fórmula já explorada à exaustão em seus roteiros anteriores. Novamente tem-se várias histórias paralelas que, de alguma forma, se cruzarão, no entanto, aqui, o resultado fica abaixo de quase todos os seus trabalhos no cinema (talvez só seja melhor do que o fraquíssimo O Búfalo da Noite). Em The Burning Plain ele até tenta, em uma certa medida, subverter essa fórmula já tão desgastada, quando apresenta algumas das viradas de sua história (que, na verdade, são percebidas por um olhar mais atento com certa rapidez, antes mesmo que aconteçam), no entanto, além de ser uma subversão pela metade (já que, de um jeito ou de outro, Arriaga continua dependente desse tipo de estrutura narrativa), falta ao filme emoção (chega a ser inacreditável a inexpressividade de uma atriz geralmente bastante competente como Charlize Theron, tamanho o subaproveitamento de seu talento), veracidade e, principalmente, personagens minimamente interessantes. Os de Kim Basinger e Joaquim de Almeida, talvez aqueles que se salvam nesse mar de desinteresse e frieza, recebem um espaço bem menor do que mereciam. Nesse sentido, por mais que se queira, não há como defender Arriaga. Seu The Burning Plain é morno, insosso.


Vincere
Vincere, 2009
Marco Bellochio


Havia algo de misterioso em torno desse Vincere que me impedia de assisti-lo nesse Festival do Rio 2009. Primeiramente, perdi a sessão do filme de Marco Bellochio que havia programado devido a um engarrafamento, que fez com que eu chegasse ao cinema 15 minutos após o início da sessão. Pois bem, resolvi dar uma segunda chance à história de Ida Dalser e Benito Mussolini, e insisti em assistir Vincere. Não deveria. Fui assustadoramente agredido (verbalmente) por três pessoas, em três momentos distintos da sessão, pelos motivos mais bizarros que se possa imaginar (não vou aqui entrar em maiores detalhes porque essa história já me aborreceu demais, talvez mais do que deveria). Logo, assisti a Vincere. Mas não assisti-o. Melhor: perdi algumas cenas, fiquei aborrecido no meio do filme, o que fez com que não conseguisse concentrar-me no que se passava na tela, e cheguei mesmo a cogitar abandonar a sala, algo que nunca faço.
Dito isso, porque estou escrevendo esse texto, então? De fato não sei se posso considerar que assisti ao filme de Bellochio, mas vou fazer aqui alguns apontamentos sobre o pouco que consegui apreender. Vincere me pareceu um belo filme. Seu maior acerto está na maneira como o diretor estrutura sua narrativa, apresentando-a num ritmo acelerado (mas não confuso) que torna o filme irresistível a quem o assiste, e pontuando com um lado musical marcante, operístico, carregado em dramaticidade. Assim, o que poderia parecer exagerado, mesmo melodramático, se revela uma escolha estética bastante acertada de Bellochio. O filme é pontuado por algumas cenas também marcantes (a começar por aquela que abre Vincere), e por um inteligente uso de imagens reais do ditador fascista, especialmente quando nos é permitido pela primeira vez ouvi-lo discursando (o que gera, logo em seguida, outra cena marcante, do filho imitando o pai). Giovanna Mezzogiorno, belíssima, rouba a cena como Ida Dalser, especialmente na segunda metade do filme, quando está já enclausurada, mas o ator que interpreta Mussolini (pai e filho) também é muito bom (e, principalmente quando dá vida ao Benito pai, lembra muito um jovem Robert De Niro). Ou seja, numa nova oportunidade, eu preciso reassistir (ou assistir pela primeira vez) Vincere. Ainda que morrendo de medo de algo desagradável acontecer novamente.

P.S.: só para acrescentar mais um capítulo à minha saga com o filme de Marco Bellochio, Vincere foi escalado para a repescagem do Festival. No domingo a noite, quando já não estarei mais no Rio...

terça-feira, 6 de outubro de 2009

[festival do rio 2009: boletim 5]

A Fita Branca
Das Weisse Band, 2009
Michael Haneke


Não é fácil gostar desse novo filme de Michael Haneke. Uma vez gostando, também não é lá muito fácil entender o porquê. O diretor austríaco opta aqui por uma estrutura bastante clássica, sem grandes brincadeiras com a linguagem cinematográfica (como em dois de seus melhores filmes, Funny Games e Caché), o que não significa que ele não demonstre um total controle desta (sendo a construção da absurda tensão em uma narrativa longa, sufocante, inquietante, o melhor exemplo disso). Nesse sentido, para quem espera rompantes de “genialidade” de Haneke aqui, o filme pode ser mesmo frustrante – todas as cenas são construídas com uma imensa calma, acompanhadas por uma narração em off que pode até soar um tanto didática. Ainda assim, A Fita Branca é um filmaço. Irresistível. É carregado de um insuportável tom claustrofóbico, reforçado por sua opressora fotografia em preto e branco, acompanhado de uma tensão crescente que incomoda ainda mais diante da probabilidade de, vindo de Haneke, muito pouco daquilo receber uma explicação no final (até porque a própria narração do personagem do professor dá a entender, logo no início, que aqueles acontecimentos nunca foram explicados). Nesse sentido, A Fita Branca lembra Caché, em sua exacerbação de tensões latentes em uma sociedade através de pequenos acontecimentos que nunca são totalmente compreendidos. Aqui, no entanto, o que Haneke faz é uma perturbadora investigação sobre a maldade, tanto num sentido geral, quanto no que diz respeito a alguns acontecimentos posteriores em terras germânicas (como diz o próprio narrador). É um filme de horror sem sê-lo, no sentido mais tradicional do termo. Mais uma vez, em um filme do diretor, muito pouco é mostrado. Mas muita coisa é dita.

domingo, 4 de outubro de 2009

[festival do rio 2009: boletim 4]

ABC Colômbia
ABC Colombia, 2007
Enrica Colussu


Esse aqui é um documentário bem tradicional, e que, por isso mesmo, termina por ser uma experiência muito pouco marcante. Acabei assistindo-o como uma espécie de "prêmio de consolação" por ter perdido a sessão do filme que desejava ver (Vincere, de Marco Bellochio), e acho que isso acabou por empurrar-me na direção de um olhar negativo sobre ele. Ou não. Porque, de qualquer forma, ABC Colômbia é um olhar europeu sobre uma questão que aflige a sociedade colombiana, especialmente a juventude rural, que, no entanto, foge de qualquer possibilidade de inventividade narrativa - não há um tom de urgência nas cenas mostradas, o que me parece fundamental numa história dessas, há apenas aquelas pessoas, contando suas experiências para a câmera. Pessoas com as quais a diretora busca estabelecer uma relação ao mesmo tempo de compreensão por suas escolhas de vida e de distanciamento, numa incômoda dubiedade (linha essa que acaba se revelando mesmo perigosa já próximo ao final do filme, quando ela pergunta a um de seus protagonistas se ele a mataria, caso tornasse-se um paramilitar e recebesse ordens para isso). Por ser uma história forte, polêmica e de difícil resolução, ABC Colômbia tem momentos que funcionam muito bem - especialmente os dois comentários finais da dupla de protagonistas. No entanto, o mérito é puramente conteudístico (e, mesmo nesse sentido, talvez fosse de ajuda ao êxito da obra uma breve contextualização da história recente da Colômbia, que tornasse possível a compreensão total de algumas das referências feitas pelos entrevistados); como cinema, o trabalho de Enrica Colussu tem muito pouco a acrescentar.


Natimorto
Natimorto, 2009
Paulo Machline


Continua de alta qualidade a parceria entre a literatura de Lourenço Mutarelli e o cinema. Se O Cheiro do Ralo havia sido um filme não menos que brilhante, esse Natimorto, apesar de não chegar a tanto, tem lá seus méritos. É macabro, morbidamente engraçado e triste como o filme com Selton Mello, na verdade até em um nível maior. Seu maior problema, entretanto, é a irregularidade, em diversos aspectos. A começar por sua dupla de protagonistas: se Simone Spoladore está muito bem em suas cenas iniciais e em alguns flashbacks, na maior parte do tempo ela parece "fora do tom", exagerando na composição de sua personagem, tornando-a pouco crível (soa estranha, por exemplo, a facilidade com que ela tolera e convive com a bizarrice de seu par, e suas mudanças repentinas de humor com este também são mal retratadas pela atriz), Mutarelli surpreende como ator, fazendo justamente o caminho inverso de sua companheira de cena, ao demonstrar certo incômodo nas primeiras cenas, mas crescendo absurdamente com o desenrolar da narrativa, fazendo de seu Agente o principal acerto de Natimorto. Não deixa de ser curioso, aliás, ver um escritor interpretando um personagem por ele criado, e a paixão depositada por Mutarelli em sua composição acaba tornando sua presença fundamental, provavelmente muito mais do que seria caso um ator profissional ocupasse o papel. A teatralidade excessiva do filme também incomoda em alguns momentos. A história de Mutarelli parece-me muito propícia para isso mesmo, por contar com apenas dois personagens em um ambiente fechado, mas em outros momentos Natimorto é extremamente "cinematográfico". Ou seja, é outra vez o problema da irregularidade. Esse desequilíbrio do filme incomoda, mas o resultado final acaba pendendo para o lado positivo pelo ótimo epílogo que Natimorto possui.

P.S.: Junto a Natimorto foi exibido o curta Predileção, de Marcio Garcia. Apesar do elenco cheio de nomes conhecidos, o filme é uma bobagem, uma cópia barata e pretensiosa de filmes de ação norte-americanos, que ainda é finalizado com uma reviravolta bobinha, bobinha (e esperada). 1 estrela para ele.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

[festival do rio 2009: boletim 3]

Abraços Partidos
Los Abrazos Rotos, 2009
Pedro Almodóvar


Juro que esperava de Abraços Partidos o oposto do que ele realmente é. Havia imaginado um filme ultra-pretensioso, que investisse em um excesso de metalinguagem (por ter o próprio mundo do cinema como um de seus temas centrais), possuindo uma narrativa de difícil apreensão – o que, imaginei, talvez explicasse a recepção morna ao filme de Almodóvar. Pois o que vi foi justamente um trabalho extremamente simples, uma mistura de suspense ao estilo Brian De Palma (em alguns momentos é quase impossível não lembrar-se de Dublê de Corpo e Vestida para Matar) com algumas pitadas de comédia almodovariana, onde nada é difícil de se compreender, havendo até mesmo um excesso de clareza narrativa. E confesso que, nesse sentido, gostei do que vi. Abraços Partidos acabou sendo uma boa surpresa. Entretanto, o filme tem lá seus problemas, sendo a irregularidade o maior deles: se em seu início, com suas primeiras idas e vindas no tempo, tudo funciona maravilhosamente bem, lá pelo meio da história as coisas se perdem um pouco, e a resolução do triângulo amoroso apresentada por Almodóvar não deixa de ser um tanto decepcionante. Da mesma forma, tudo envolvendo o personagem Ray-X é tratado com pouco cuidado, e algumas revelações já próximas ao epílogo, feitas por Blanca Portillo, soam demasiadamente didáticas, forçadas, e mesmo melodramáticas (no caso da última delas, a seu filho). Apesar de ser um admirador do cinema de Almodóvar especialmente quando este assume um tom mais sério, a partir de Carne Trêmula (chegando a seu melhor trabalho em Fale com Ela), curiosamente, achei que nesse Abraços Partidos os grandes momentos ficam por conta do lado cômico do diretor – é o velho "jovem Almodóvar" dando sinais de vida, e lembrando-nos do quanto ele ainda sabe arrancar risos da platéia. No fim das contas, esse acaba sendo o menor filme dele desta década – o que também não chega a ser exatamente um problema, levando-se em conta a qualidade de seus outros trabalhos produzidos nesse período.

P.S.: É impressionante como, a cada dia que passa, Penélope Cruz não só evolui como atriz (especialmente quando atua em espanhol) como se torna mais e mais linda.

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

[festival do rio 2009: boletim 2]

Mother
Madeo, 2009
Bong Joon-Ho


O que pode haver de comum entre um filme de monstro e um drama familiar sobre uma mãe em busca de liberdade para o filho inocente? Mais eclético impossível, correto? Errado. É impressionante o quanto esse Mother, novo longa de Bong Joon-Ho, guarda semelhanças com seu trabalho anterior, o excelente O Hospedeiro. Assim como lá a figura do monstro que surge no rio Han e as críticas políticas eram menos importantes do que a busca daquele pai para recuperar sua filha amada – e ao mesmo tempo redimir-se consigo mesmo –, aqui a investigação sobre o verdadeiro autor do crime que levou o filho da protagonista à prisão é secundária, diante da determinação e do amor que movem a personagem. Nesse sentido, O Hospedeiro e Mother são exatamente sobre a mesma coisa: até onde se é capaz de ir para defender alguém que se ama. No entanto, ao mesmo tempo que continua a trafegar com grande desenvoltura por diferentes gêneros – aqui ele vai do drama familiar ao thriller policial e à comédia de humor negro com imensa facilidade e leveza –, Joon-Ho realiza uma obra que vai além do seu filme anterior em densidade e profundidade reflexiva. Mother conta com uma protagonista hipnótica, fascinante (interpretada com gigantismo por Kim Hye-Ja), que torna quem o assiste, logo de cara, cúmplice daquela mulher. O que faz com que o caminho que ela irá trilhar a partir dali, a desembocar na reviravolta final da trama, deixe marcas difíceis de tirar nesses cúmplices da mãe do título. Por tudo isso, Mother merece quatro estrelas. A quinta é por sua cena final.
[festival do rio 2009: boletim 1]

Brilho de uma Paixão
Bright Star, 2009
Jane Campion


Comecei com o pé esquerdo o Festival do Rio 2009. Brilho de uma Paixão, da neozelandeza Jane Campion, é um drama de época correto, bem produzido, dono de algumas belas imagens - e que conta com uma boa dupla de protagonistas, especialmente a ótima Abbie Cornish (que tem feições que lembram bastante as de Nicole Kidman). No entanto, o filme é de uma chatice impressionante. Em sua primeira metade, a narrativa até flui bem, chegando a ser admirável a calma com Campion desenvolve o amor entre o poeta John Keats e a jovem Fanny Brawne, mas, quando o romance finalmente se concretiza, o aborrecimento toma conta. Uma série de idas e vindas amorosas é filmada sem a menor paixão, e a obviedade do que se vê na tela chega a ser irritante. Em seu epílogo, Brilho de uma Paixão até recupera um pouco de sua qualidade inicial, graças, novamente, a Cornish, que entrega duas belas cenas (a reação de Fanny ao destino de Keats e a sequência que encerra o filme), no entanto, àquela altura, a vontade de que o filme simplesmente termine já tornou-se irresistível, e esses bons momentos passam quase que completamente despecebidos. Não pude evitar de pensar sobre a possível qualidade que essa história alcançaria nas mãos de um diretor como Joe Wright, que já fez dois belos trabalhos em longas de época (Orgulho e Preconceito e principalmente Desejo e Reparação), ambos carregados de um frescor impressionante - que é justamente o que mais falta a esse Brilho de uma Paixão.


Che 2 - A Guerrilha
Che: Part Two, 2008
Steven Soderbergh


Como havia dito em meu texto sobre O Argentino, acho admirável esse empreendimento de Steven Soderbergh sobre a vida de Che Guevara. Respeitoso, apaixonado por seu retratado, mas não mitificador, e dono de pequenas cenas de grande beleza. E, se o primeiro filme pecava pelo excesso de detalhismo no olhar sobre a guerrilha que levaria à tomada do poder em Cuba, o que tornava-o arrastado em alguns momentos, essa segunda parte parece resolver completamente esse problema, e apresentar-se como o que um filme sobre Guevara deve ser: belo e violento, terno e brutal. Apaixonante. Soderbergh continua a acompanhar o dia-a-dia dos guerrilheiros, no entanto, agora ele insere letreiros que situam o espectador na passagem do tempo na selva boliviana, o que faz com que, conhecendo-se o destino daqueles personagens, o filme transforme-se em uma trágica e melancólica contagem regressiva. Esse clima de tristeza perpassa, ainda que sutilmente, toda a narrativa do filme. A Guerrilha ganha então tons de urgência, de thriller político, sem ter de, para isso, apelar para maneirismos com a câmera ou montagem acelerada: Soderbergh continua contemplativo, mas agora elevando a tensão da história que conta. E Benicio Del Toro, que já encantava no primeiro filme por sua caracterização contida e convicta, aqui comove profundamente com o retrato de um homem movido por seus ideais, mesmo quando à beira da morte. A cena, já no final de A Guerrilha, entre Che e o soldado que o guarda é o exemplo máximo da potência de sua interpretação - e do poder que a figura de Guevara carregava.