terça-feira, 24 de maio de 2011


[o vencedor]

O Vencedor
The Fighter, 2010
David O. Russell


Passei grande parte da primeira metade de O Vencedor com um nó na garganta. Ver o personagem miserável de Mark Wahlberg sofrer nas mãos de sua família, composta por figuras tão ou mais miseráveis que ele, é uma tarefa árdua. E mais doloroso ainda é acompanhar o relacionamento destrutivo entre Wahlberg e seu irmão interpretado por um assombroso Christian Bale. Há tanto amor entre os dois, tanto carinho, e mesmo assim o resultado desses encontros não passa de uma sucessão de desastres, que servem para afundá-los ainda mais em sua miséria sem fim. Ecos de Touro Indomável? Elogio maior não poderia ser feito ao filme de David O. Russell, que é, de fato, uma gratíssima surpresa. Para além de todos os clichês de um aparente legítimo representante do gênero "história de superação", O Vencedor é um filme sobre pessoas que se amam desesperadamente, mas que não são capazes de transformar esse amor em algo construtivo. O Dick Eklund de Bale é o exemplo máximo disso: ex-grande promessa do boxe, ex-"orgulho de Lowell", o personagem é dono de um carisma absurdo e de uma intensidade contagiante; mas deixar-se seduzir por ele significa ir com ele para o buraco. Eklund não passa, no momento em que o encontramos no filme, de um viciado em crack que destrói tudo e todos a seu redor, simplesmente porque é alguém adorável demais para ser odiado ou abandonado. É claro que para nós, espectadores, que não conhecemos o verdadeiro Dick Eklund, resta a caracterização de Christian Bale. E como o ator entrega aqui aquele que é, de longe, o melhor desempenho de sua carreira (e, voltando a lembrar de Touro Indomável, um desempenho talvez comparável ao de De Niro na obra-prima de Scorsese), entendemos direitinho o porquê do amor incondicional que todas aquelas figuras grotescas (e verdadeiras, por conseguinte), nutrem pelo não menos grotesco Eklund.
Quando O. Russell mira sua câmera para o turbilhão de emoções que envolve seus personagens, para as dolorosas discussões familiares e as tentativas de manutenção do controle pela matriarca Melissa Leo (outra atuação fabulosa), para o amor redentor entre os personagens de Wahlberg e Amy Adams, para os rostos marcados pelo sofrimento da popualção de Lowell, o diretor fica bem próximo de realizar uma obra-prima. O problema é que há o boxe na história. E a abordagem para a trajetória esportiva de Micky War segue a cartilha do "drama esportivo com mensagem edificante". Sai de cena Touro Indomável, e entra Rocky. E daí O Vencedor cai bastante em qualidade. Ou seja, o que temos aqui é um filme de boxe mediano, e um poderoso drama familiar.

6 comentários:

Alan Raspante disse...

E eu pensando que era apenas mais um drama sobre um lutador qualquer. Preciso ver!

Wallace Andrioli Guedes disse...

Mas é apenas mais um drama sobre um lutador qualquer. Só que dos bons.

Cristiano Contreiras disse...

Gosto do filme, mas não vejo nenhuma obra-prima como muitos apontaram e nem algo tão excepcional assim. Achei tema e personagens "batidos", já vimos muito por aí. Mas, de fato, o elenco está soberbo.

Mas, pra mim, a melhor atuação de Bale é no "Psicopata Americano" e lembremos dele no ótimo "O Operário" também.

Abraço

Rafael Carvalho disse...

Sua última frase define de forma muito feliz o filme. Existem muitas nuances em cada um dos quatro personagens principais que o filme apresenta de forma bastante orgânica na narrativa, fortalencendo o que seria somente esse filme de boxe edificante. Leo e Bale estão assombrosos.

BillyCapra disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
BillyCapra disse...

Melhor filme do ano, se esquiva brilhantemente de todos os clichês.