sábado, 20 de dezembro de 2008

No cinema: Queime Depois de Ler

[queime depois de ler]

Queime Depois de Ler
Burn after Reading, 2008
Joel Coen & Ethan Coen

Os irmãos Coen são conhecidos, principalmente, por suas comédias de humor negro, mas, na última vez que se aventuraram pelo gênero, entregaram o fraco Matadores de Velhinhas, o que acaba, de certa forma, aumentando a responsabilidade em cima desse Queime Depois de Ler (além do fato óbvio de ser o primeiro filme da dupla após a consagração no último Oscar, com a obra-prima Onde os Fracos Não Têm Vez). No entanto, como costumam fazer com certa freqüência, os Coen voltam aqui a surpreender, com uma pequena pérola.
Na verdade, Queime Depois de Ler repete a fórmula que a dupla de cineastas tanto utiliza em seus filmes: a história de alguém que, por ambiciar algo, acaba passando por cima de outras pessoas e dando início a uma série de tragédias que parece não ter fim. Foi assim em Fargo, foi assim em O Homem que Não Estava Lá e foi assim, ainda que seguindo por outros caminhos, em Onde os Fracos Não Têm Vez. No entanto, ao contrário destes três filmes, que possuem uma atmosfera dramática mais carregada (ainda que Fargo não deixe de ser, em certo sentido, também uma comédia), em Queime Depois de Ler estamos no campo da "comédia de erros", no qual os Coen geralmente se saem muito bem. E o que se vê na tela é uma verdadeira escalada de erros, de confusões e de mal-entendidos protagonizados por uma série de personagens que simplesmente não conseguem enxergar o que está acontecendo a seu redor, e que são tomados por uma assustadora onda de estupidez.
E mesmo que seja uma espécie de continuação informal dos dois outros "episódios" do que os irmãos Coen chamam de "trilogia dos idiotas", E Aí, meu Irmão, Cadê Você? e O Amor Custa Caro, ambos protagonizados pelo mesmo George Clooney de Queime Depois de Ler, quem sintetiza essa estupidez com perfeição é o personagem de Brad Pitt. Absolutamente hilário em todas as suas cenas, Pitt rouba o filme com a simplicidade de seu Chad Feldheimer, um sujeito genuinamente inocente, e extremamente encantador por isso. São dele os melhores momentos de Queime Depois de Ler, como a conversa ao telefone com o personagem de John Malkovich (excelente) e a cena do armário com Clooney. Ainda que sua participação não seja muito longa, o que se tem aqui é um dos melhores desempenhos de sua carreira, e é difícil não ficar com a imagem de seu personagem na cabeça após o término do filme. Porém, a burrice de Feldheimer parece, de alguma forma, contagiar outros personagens do filme. Na verdade, quase todos: do paranóico agente do Tesouro vivido por um divertido George Clooney (e autor de um bizarro invento, que gera uma das cenas mais engraçadas do longa) à professora de ginástica interpretada de forma inspirada por Frances McDormand. E é curioso que, no meio do festival de burrices que presenciamos, os dois agentes da CIA que observam todo o caso (vividos por J.K. Simmons e David Rasche), que são uns dos poucos a demonstrar certa racionalidade, também sejam responsáveis por momentos de humor extremo, exatamente pela perplexidade com que acompanham o desenrolar dos fatos, sem conseguir entender muita coisa.
Contando com uma melancolia nas entrelinhas de sua narrativa, e que acaba movendo seus personagens em seus atos desastrosos, Queime Depois de Ler é um legítimo exemplar do cinema dos irmãos Coen, que cativa pelo talento dos diretores em fazer humor de situações trágicas sem que seus filmes soem ofensivos. Talvez o segredo esteja em tornar seus personagens verdadeiramente humanos, algo que os Coen sabem fazer como poucos. E é também a resposta inesperada a quem esperava outro filme denso e sério após Onde os Fracos Não Têm Vez. Resposta inesperada e, talvez justamente por isso, genial.

Um comentário:

Bruno disse...

Gostei bastante deste filme, é um humor negro bem característico dos Coen. E realmente o Brad Pitt está absolutamente hilário, é a melhor interpretação do filme, o que não é pouca coisa, tendo em vista que o elenco é de peso e todos estão muito bem em seus papéis.

Quanto a O Homem Que Não Estava Lá, até hoje não tive a oportunidade de assistir.

Abraço!