quarta-feira, 3 de outubro de 2012


[festival do rio 2012 - parte 1]



Holy Motors 
Holy Motors, 2012
Leos Carax


Ao apresentar Holy Motors na sessão de gala do Festival do Rio, o cineasta Leos Carax classificou seu filme como muito simples, compreensível nem que seja após um breve período de digestão. Mesmo diante da bizarrice reinante na narrativa, que parece ter assustado muitos dos presentes no cinema, acredito que Carax tem certa razão: talvez seja possível "entender" Holy Motors.  
Esse é um filme, a meu ver, sobre a mentira - não necessariamente num sentido negativo - como base da representação cinematográfica. Afinal, o protagonista Oscar (que nome mais apropriado!) não passa de um ator que vive diferentes realidades ao longo do dia. Essencialmente um mentiroso, portanto, já que nenhum daqueles homens mostrados na tela é realmente ele, nenhuma daquelas historietas é de fato a história de sua vida. É da noção de farsa, de falsa realidade, que vive o cinema. É ela que permite aos filmes trabalhar com elementos fantásticos (mostrar carros falando, por exemplo) mas também produzir no espectador a ilusão de se estar vivendo o que é contado. 
Indo um pouco além, a mentira também embasa a vida fora das telas, as muitas máscaras que usamos no cotidiano (postura que se literaliza em Holy Motors, tanto na constante mutação sofrida por Oscar quanto na ação final da personagem da motorista). Para Carax, viver e narrar (fazer cinema) são faces da mesma moeda, do mesmo olhar mentiroso/representacional para o mundo. 
É preciso reconhecer que talvez eu esteja apenas arranhando a superfície de Holy Motors com essa minha tentativa de compreender o que assisti. Mas, ainda assim, mesmo que meu olhar seja pouco aprofundado ou equivocado, permanece a experiência de um filme instigante, que provoca estranheza no espectador sem lançá-lo para fora da narrativa - na realidade, o movimento é inverso, quanto mais bizarros são os acontecimentos vistos na tela, mais presa àquele mundo fica a atenção do público, num resultado muito próximo ao alcançado por algumas obras de David Lynch, por exemplo. Um filme muito bem conduzido por seu diretor/roteirista e que traz no desempenho do protagonista Denis Lavant um dos mais impressionantes trabalhos de atuação dos últimos tempos. Certas coisas bastam para produzir amor por alguns filmes, tornando descartável a costumeira necessidade de compreender plenamente as histórias narradas por eles. 

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