quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Alguns filmes - Dezembro

[alguns filmes - dezembro]


Rede de Intrigas
Network, 1976
Sidney Lumet


A Múmia: Tumba do Imperador Dragão
The Mummy: Tomb of the Dragon Emperor, 2008
Rob Cohen


Arquivo X - Eu Quero Acreditar
The X Files - I Want to Believe, 2008
Chris Carter


Cinturão Vermelho
Redbelt, 2008
David Mamet


Casa de Areia e Névoa
House of Sand and Fog, 2003
Vadim Perelman


Estômago
Estômago, 2007
Marcos Jorge


Um Crime Americano
An American Crime, 2007
Tommy O'Harver


Trovão Tropical
Tropic Thunder, 2008
Ben Stiller


Mamma Mia! - O Filme
Mamma Mia!, 2008
Phyllida Lloyd


O Procurado
Wanted, 2008
Timur Bekmambetov


Kate & Leopold
Kate & Leopold, 2001
James Mangold


Violência Gratuita
Funny Games U.S., 2008
Michael Haneke


A Espiã
Zwartboek, 2006
Paul Verhoeven


O Escafandro e a Borboleta
Le Scaphandre et le Papillon, 2007
Julian Schnabel


Uma das maiores obras do mestre Sidney Lumet, Rede de Intrigas é um filme primoroso, porque inusitado e imprevisível. É um retrato tragicômico dos bastidores da TV, onde tudo é um tanto exagerado, mas onde tudo soa estranhamente real. Na realidade, ainda que conte com uma história envolvente, e que aborda com acidez o universo retratado, Rede de Intrigas é um filme completamente alicerçado em seu elenco. Além do excepcional elenco de coadjuvantes, que conta com desempenhos inspirados de Robert Duvall (perfeito no retrato de um sujeito que a materialização da ganância), Ned Beatty e Beatrice Straight (em uma pequena, mas forte participação), há, obviamente, o fabuloso trio de protagonistas: Peter Finch (que levou o Oscar de melhor ator postumamente por esse seu trabalho), William Holden e Faye Dunaway (vencedora do prêmio de melhor atriz). É difícil escolher o melhor em cena. Talvez Dunaway e Holden tenham trabalhos dramaticamente mais elaborados, especialmente ela, que encanta com uma figura que esbanja poder e ganância em sua profissão, mas é amorosamente frustrada. Mas é Finch quem mais impressiona. Provavelmente pelo inusitado de seu personagem, que cativa profundamente, primeiramente por sua coragem inicial, posteriormente pelo misto de estranhamento e tragédia que acaba por incorporar com seu show, o ator é o dono do filme. Howard Beale é daqueles personagens inesquecíveis que o cinema consegue criar de vez em quando, e que encantam por sua humanidade. É ele quem eleva Rede de Intrigas a um patamar ainda mais alto, e que revela o poder e contundência da crítica feita por Lumet e pelo roteiro de Paddy Chayefsky. É ele, no fim das contas, quem garante ao filme seu lugar entre os grandes clássicos do cinema norte-americano.
Existem filmes que simplesmente não deveriam ser feitos, e outros que deveriam, mas que, da forma como tornaram realidade, seria melhor se também não fossem realizados. Entre os primeiros se enquadra A Múmia: Tumba do Imperador Dragão, desnecessário terceiro capítulo da série iniciada em 1999, com o divertido A Múmia, e que deveria ter se encerrado ali. Sem o diretor dos dois primeiros capítulos, o ruim Stephen Sommers, esse novo filme tem em seu lugar o péssimo Rob Cohen, o que não ajuda muito. Também não ajuda a troca de atrizes no papel da protagonista Evelyn O'Connell: sai a sempre ótima Rachel Weisz, entra a geralmente, mas não aqui, boa atriz Maria Bello. Tem-se ainda um Brendan Fraser no piloto automático e um Jet Li com muito pouco a fazer em cena, além de John Hannah novamente como alívio cômico. Mais enfadonho, impossível. Nem as cenas de ação e os efeitos especiais salvam o filme do desastre. Talvez tenha faltado o bom e velho Imhotep. Já entre os segundos, se enquadra Arquivo X - Eu Quero Acreditar. Além do inegável fascínio que a série de Chris Carter ainda gera, Arquivo X - O Filme, de 1998, era um bom filme. Então, o que deu errado, ainda mais se levarmos em conta que o diretor desse aqui é o próprio Carter, criador da série? Difícil dizer. Mas a verdade é que esse novo filme é uma grande bobagem: conta com uma trama simples e boba, com personagens rasos, muito mal desenvolvidos (o que faz com que David Duchovny e Gillian Anderson não possam fazer muita coisa por Mulder e Scully) e com um mistério que, se conduzido de uma maneira mais cuidadosa, poderia gerar bons resultados, mesmo com a bizarrice de sua premissa, mas que aqui é simplesmente resolvido num confronto físico, que ainda por cima é extremamente sem graça. Uma pena, realmente.
É bastante inusitado ver um roteirista e dramaturgo respeitado como David Mamet fazendo um filme sobre jiu-jitsu, uma temática que, normalmente, ficaria relegada a filmes de ação B. E mais inusitado ainda acaba sendo o fato de esse filme ser simplesmente ótimo. Na verdade, a força de Cinturão Vermelho está em seus personagens, e na forma como Mamet conduz seus dramas. Mais especificamente, o drama do protagonista, vivido com brilhantismo pelo ótimo, e ainda pouco reconhecido, Chiwetel Ejiofor. É o ator quem consegue tornar crível um personagem que facilmente se transformaria em caricatura (o professor honrado, cheio de moral e contrário à competições, apegado à verdadeira essência do esporte que ensina), o que acaba por tornar seu grande dilema palatável e compreensível para o espectador. É bem verdade que o filme trabalha com clichês em demasia, o que acaba por torná-lo excessivamente previsível em seus momentos finais, culminando numa última cena que, apesar de bastante justa com o protagonista, acaba soando um pouco forçada (ainda que seu desenrolar seja, inegavelmente, empolgante). Com um pouco mais de cuidado, Mamet conseguiria algo verdadeiramente inusitado: fazer de Cinturão Vermelho uma obra-prima. Do jeito que está, é uma agradável surpresa (até por trazer também um inesperado bom desempenho de Tim Allen).
Casa de Areia e Névoa é um ótimo filme, um drama poderoso. No entanto, de alguma forma, ser só isso é seu maior pecado. Com a história e com o elenco que possui, era para ser uma obra-prima. No entanto, o diretor Vadim Perelman conduz tudo excessivamente de acordo com o esperado, não permitindo grandes surpresas ao espectador. Até a tragicidade da história se torna previsível. No fim das contas, quem toma conta do filme é Ben Kingsley. Construindo um personagem ao mesmo tempo bruto e terno, orgulhoso e extremamente humano e sonhador, o ator inglês ofusca todos ao seu redor, inclusive a geralmente ótima Jennifer Connely, que acaba prejudicada por ter em suas mãos uma personagem que não faz muita coisa além de chorar por todo o filme. É Kingsley quem mantém a dignidade de Casa de Areia e Névoa mesmo quando a trama descamba para um conflito mal desenvolvido envolvendo seu personagem, seu filho e o policial amante da personagem de Connely, e é ele também quem garante, logo depois, o momento de maior emoção do filme, em seu trágico epílogo. É um grande ator em um grande papel em um filme apenas bom.
É preciso que se diga: Estômago é uma pequena jóia do cinema nacional recente. O diretor Marcos Jorge, em sua estréia em longa-metragens, conseguiu algo que muitos filmes brasileiros vêm tentando há algum tempo, mas que nenhum até agora havia alcançado totalmente: o equilíbrio perfeito entre um cinema erudito, sofisticado e com conteúdo, e um cinema de caráter popular, que trabalhe com naturalidade e sem estereótipos com elementos da cultura popular. O filme não é perfeito, tem alguns pequenos escorregões, mas é, como um todo, admirável. Em diversos momentos, tive a impressão de estar assistindo a uma espécie de herdeiro do cinema de Joaquim Pedro de Andrade, e, mais especificamente, de Macunaíma. E, para quem conhece minha admiração por esse cineasta e por seu mais conhecido filme, sabe que esse é um elogio considerável. É curioso como, quase 40 anos após o lançamento de Macunaíma, o cinema brasileiro reencontra a fórmula perfeita entre o cinema popular e o chamado cinema de arte justamente retomando a temática da antropofagia, tão cara a Joaquim Pedro. O que temos aqui, definitivamente, não é uma coincidência: é um belo tema para estudo mais aprofundado. Por fim, é impossível escrever sobre Estômago sem citar a presença magnética de João Miguel. Ainda que a excelente Fabiula Nascimento também mereça destaque por sua atuação, é de Miguel a responsabilidade de tornar a história de Estômago palatável e envolvente, e de tornar seu Raimundo Nonato um personagem identificável, sem se tornar uma mera caricatura do migrande nordestino. E o ator cumpre essa missão com não menos que brilhatismo.
O maior pecado de Um Crime Americano é sua falta de ambição. Conta uma história contundente, marcante e polêmica, que poderia render um pequeno clássico. Possui desempenhos inspirados de suas duas protagonistas, a jovem, e cada vez melhor, Ellen Page, e uma estupenda Catherine Keener, que consegue a proeza de humanizar uma personagem responsável por um crime inimaginável. No entanto, o diretor Tommy O'Harver filma tudo com excessiva simplicidade e descuido, fazendo de Um Crime Americano algo próximo de um filme feito para a TV. Com isso, nem os poucos momentos mais inspirados de sua direção, como a seqüência de uma possível fuga da personagem de Page, conseguem salvar o filme. E, no fim das contas, todos os questionamentos que tal história nos leva a fazer, acabam soando menos importantes do que realmente são, o que acaba sendo um pecado imperdoável. Em suma, é um filme menor do que deveria ser.
Não sou lá um grande fã de Ben Stiller, mas devo reconhecer que, como diretor, ele demonstra algum talento, que, como ator, ainda não veio à tona. E essa é uma constatação que se pode fazer assistindo a Trovão Tropical. Enquanto protagonista, Stiller, mesmo contando com um personagem naturalmente engraçado, consegue, no máximo, ser uma presença absurdamente irritante por todo o filme. Já como diretor, ele entrega uma das mais bem sacadas sátiras à Hollywood já feitas. É bem verdade que Trovão Tropical perde um pouco o fôlego em alguns momentos, especialmente em seu epílogo, onde acaba se transformando simplesmente em um besteirol de ação, mas aí o estrago já havia sido feito: contando com um Robert Downey Jr. simplesmente genial em cena, e com uma participação inesperada, e hilária, de Tom Cruise, Stiller destrói, sem nenhum perdão os egos inflados de atores e produtores de cinema, em uma sucessão absurda de piadas ácidas sobre os bastidores de Hollywood. E faz um filme que, por mais irregular que seja, merece inúmeros aplausos nem que seja por sua imensa coragem e por sua total falta de correção política.
Filmes ruins existem aos montes, lançados todos os anos nos cinemas. No entanto, poucos filmes conseguem ser tão ruins quanto Mamma Mia! - O Filme. E o que mais impressiona é que a diretora Phyllida Lloyd tinha tudo para entregar um musical simpático, divertido, gostoso de se assistir. Ela tinha nas mãos as melosas, mas adoráveis, canções do ABBA, e tinha, principalmente, Meryl Streep. Por isso é tão assustador que Mamma Mia! seja essa grande bomba que é. Na verdade, o filme é simplesmente uma aberração, uma sucessão inacreditável de cenas constrangedoras e de números musicais ridículos, protagonizados por uma série de bons atores (Pierce Brosnan, Colin Firth, Stellan Skarsgard, Julie Walters) naqueles que são os piores desempenhos de suas carreiras. E, bem, há Meryl Streep. Que ninguém duvida de seu talento, isso é fato. Mas, talvez pela primeira vez, nem a presença de Streep merece ser elogiada nesse filme. A grande atriz também entra na onda do ridículo, e entrega a sua pior atuação. No fim das contas, Mamma Mia! é somente um coisa: lamentável.
Até um certo ponto, todos os exageros e extravagâncias de O Procurado mantêm o filme em um nível aceitável: basta desprender-se da realidade e se divertir com as acrobacias e cenas de ação impossíveis dos personagens. No entanto, chega um momento em que tudo aquilo se torna absolutamente irritante, insuportável e enfadonho, e o filme descamba para justamente aquilo que se poderia esperar dessa estréia do diretor russo Timur Bekmambetov no cinema norte-americano: ele se torna um filme ruim. E aí nem o ótimo elenco, que conta com o sempre bom James McAvoy, Angelina Jolie e Morgan Freeman (no piloto automático, como de costume recentemente) pode fazer muita coisa por O Procurado, nem que seja para torná-lo ao menos um filme de ação decente.
Kate & Leopold é uma comédia romântica até simpática, mas excessivamente comum e previsível, e que se apoia quase que totalmente na ótima presença de Hugh Jackman. Aqui ainda no início de sua fama, o ator encarna com perfeição o papel do nobre deslocado no tempo, ofuscando completamente sua companheira de cena e par romântico Meg Ryan. Demasiadamente adocicado e com um final que, por mais previsível que fosse, poderia gerar mais emoção do que gera, Kate & Leopold é um filme inofensivo, mas que acaba sendo uma decepção, vindo do geralmente bom James Mangold.
Vendo esse novo Violência Gratuita, e conhecendo as motivações de Michael Haneke ao fazê-lo (ampliar o público da história contada por ele no longa original, alcançando agora os principais consumidores do tipo de cinema que ele tanto busca criticar, os norte-americanos), é impossível não se perguntar: havia realmente essa necessidade de refilmar um filme que já era perfeito? Na verdade, o que surpreende é que, mesmo sendo uma refilmagem quadro-a-quadro, o que faz com que não traga nada de novo para quem já tenha assistido à versão original, Violência Gratuita traz uma surpresa agradável, e talvez até inesperada, para os admiradores do trabalho de Haneke: dez anos depois, com atores diferentes e falada em inglês, tal história continua guardando uma força absurda, e um enorme poder de provocar e causar impacto, mesmo em quem já a conhece. Por isso, o novo Violência Gratuita, mesmo que não consiga alcançar o objetivo principal de seu diretor (já que não foi exatamente um grande sucesso de bilheteria nos EUA), serve para confirmar ao menos uma coisa: sua genialidade.
Mesmo quando faz um filme realmente sério e de formato clássico, Paul Verhoeven consegue ser grande. É o caso desse A Espiã. Ao mesmo tempo que empolga com sua trama de espionagem em tempos de guerra, o longa exala sensualidade e ousadia, especialmente por contar com uma protagonista impecável: Carice Van Houten. Com seu olhar ao mesmo tempo terno e misterioso, a atriz constrói uma figura apaixonante, uma verdadeira heroína que remonta a grandes clássicos do cinema; seu sofrimento e suas desventuras são vividos com angústia pelo espectador, graças ao talento da dupla Verhoeven/Van Houten. Contendo algumas cenas primorosas (como a humilhação às colaboracionistas e, principalmente, a fuga pós-injeção em meio à multidão) e com um final profundamente reflexivo e triste, ainda que sutil, A Espiã é mais um grande filme do subestimado Verhoeven a ser descoberto.
Confesso que, a princípio, por mais elogiado e premiado que seja, O Escafandro e a Borboleta não despertava grande interesse de minha parte, afinal de contas, não seria esse mais um filme sobre alguém que supera uma situação inimaginável, de terrível sofrimento (como de costume, alguma doença, no caso, o resultado de um derrame cerebral) e deixa para as pessoas "normais" uma mensagem positiva sobre a vida? No entanto, após assistir ao filme, assustou-me o quanto estava sendo injusto com esse trabalho de Julian Schnabel. Primeiramente, porque, no que concerne ao aspecto dramático, O Escafandro e a Borboleta é brilhante: faz de uma história que poderia facilmente se tornar piegas um drama poderoso, doloroso e absurdamente humano. Schnabel faz poesia com imagens e conta com um protagonista que merece todos os prêmios e elogios do mundo. No papel do editor da revista "Elle" Jean-Dominique Bauby, Mathieu Amalric impressiona, especialmente por sua capacidade de expressividade na condição em que se encontra o personagem que interpreta (só movendo um dos olhos). É bem verdade que Amalric está cercado de grandes coadjuvantes, todos esplêndidos (com destaque para Marie-Josée Croze, Max Von Sydow e Emmanuelle Seigner), mas o ator é o dono do filme, sua presença se impõe a todo momento e sua composição é algo para entrar para a história do cinema. Em seguida, há o aspecto estético, e talvez seja aqui que o filme impressione mais. Schnabel radicaliza no uso da câmera subjetiva, privando espectador, por boa parte de sua narrativa, de qualquer visão que não aquela do protagonista. Ou seja, em boa parte de O Escafandro e a Borboleta, apenas vemos o que o olho esquerdo de Bauby vê, o que acaba gerando alguns momentos de imensa genialidade e poesia, como quando o protagonista chora (ao mesmo tempo que possui grande importância na relação deste com os outros personagens do longa, uma vez que, conjugada a narração em off de Amalric, essa opção estética de Schanbel e do diretor de fotografia Janusz Kaminski define perfeitamente o turbilhão de emoções pelo qual passa o personagem). Transbordando em emoção sem ser meloso ou apelativo, o filme de Schnabel (que lembra, em muitos aspectos, o também maravilhoso Mar Adentro, ainda que, em boa medida, seus protagonistas sejam opostos) conseguiu, com todo seu arrojo estético e força dramática, devolver minha fé nos "filmes de doença", ao mesmo tempo que se coloca naturalmente como uma das melhores experiências cinematográficas que vivi recentemente.

Um comentário:

Diego Rodrigues disse...

O Escafandro e a Borboleta é um filme que me cativou desde o primeiro momento. Vou me apegar mais a falar dele porque eu realmente ainda estou sensibilizado por ele.

A atuação de Mathieu Amalric é excelente, digna de reconhecimento. Ele é, sem dúvidas, um dos melhores atores dessa geração. A fotografia é outro ponto fabuloso, junto com a bela direção.

Trovão Tropical é um bom filme,mas Downey Jr é O Cara! Casa de Areia e Névoa eu concordo em boa parte contigo! Por este post acho que já tá de bom tamanho o comentário né? asdkopasdko

Até mais! (atualizei lá meu blog a proposito)